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Homem simples e comum: procuro ser gentil com as pessoas, amigo dos meus amigos e bondoso com a minha família. Sou apaixonado por filmes, internet, livros, futebol e música. Estou tentando sempre equilibrar corpo e mente, manter-me informado das notícias a nível mundial, ministrar aulas de geografia em paralelo às pesquisas acadêmicas que desenvolvo e, no meio de tudo isso, tento achar tempo para o lazer e o namoro. Profissionalmente,sou geógrafo e professor de Geografia no Ensino Básico, Técnico e Tecnológico do Instituto Federal do Maranhão (IFMA ­ Campus Avançado Porto Franco) e Doutorando em Geografia Humana na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. Membro do Grupo de Estudos: Desenvolvimento, Modernidade e Meio Ambiente (GEDMMA) e do Núcleo de Estudos do Pensamento Socialista Pesquisa do Sindicalismo (NEPS), ambos da UFMA. Participo da Rede Justiça nos Trilhos.

segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

Um ano depois de conflitos e invasão de aldeias, madeireiros retomam suas atividades na Terra Indígena Alto Turiaçu, Maranhão


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Por Cani
Há mais de 1 mês as lideranças do Conselho de Gestão Ka’apor e Guardas Florestais idenificam a presença ou retorno de madeireiros para antigos ramais fechados por ocasião das constantes operações realizadas pelo próprio povo. Mas, nesses últimos meses, com um contexto de divisão entre o povo incentivado por servidores da FUNAI Maranhão, opondo-se um pequeno grupo de lideranças ao Conselho de Gestão Ka’apor que tem acompanhado o conselho de 14 aldeias.
Esses fatos têm ameaçado processos organizativos criados nesses últimos 4 anos após a 1ª Assembleia Ka’apor, potencializado pelo Acordo de Convivência pactuado entre o povo que tem sido descumprido por lideranças dissidentes, aliciados aos ilícitos ambientais. Logo, outros processos construídos para a organização interna do povo tem sido prejudicado e afetado, como o andamento das atividades educativas e formativas na educação escolar indígena nas aldeias e no Centro de Formação Ka’apor; impossibilitando a participação de gestores na condução e gestão de uma saúde indígena de qualidade junto ao Polo Base de Saúde; dificultando o acesso aos benefícios sociais com a decisão arbitrária e autoritária da CR Funai Maranhão em exonerar Itahu Ka’apor e; comprometendo as ações de monitoramento territorial e ambiental contra a exploração ilegal de madeira.
Essas praticas tem ameaçado e procurado deslegitimar os processos organizativos retomados pelo povo, a única instancia de decisão do povo que chamam de Tuxa tá pame que é o Conselho de Gestao Ka’apor. Tentam desviar o foco das atenções para evitar ações de monitoramento territorial e ambiental que foram determinantes para a proteção do território. Percebe-se um investimento de agentes externos junto a lideranças para a divisão e o conflito. Seja agentes governamentais, sejam agentes agressores do meio ambiente. Logo, os agentes colaboradores dos processos acumulados ao longo desses quase quatro anos passam a ser visto como obstáculos de um plano arquitetado que precisa ser executado, implantado para o retorno dos ilícitos ambientais. Afinal, o PIB da região precisa crescer, a região precisa voltar a desenvolver, como discursava os candidatos a prefeito eleitos na corrupção eleitoral, aliados da bancada ruralista-madeireira na ALEMA.
Diante disso, corre o silencio sobre as agressões, tiros, invasões de aldeias, assassinatos de indígenas no Território Indígena Alto Turiaçu. Ninguém se pronuncia, nem apura e nem faz a justiça acontecer.
Mas, o que vemos é parcerias entre o órgão que deveria garantir a proteção dos territórios indígenas e o que deveria garantir a segurança de todos os cidadãos, reprimindo, perseguindo indígenas. Invés de coibir os assaltos e roubos diversos a órgãos públicos e agencias bancarias na região, retirar as pessoas que ameaçam a integridade física e social, temos uma policia que persegue indígenas tomando motocicletas, abordando indígenas e apreendendo caminhonetes que prestam serviços sociais aos indígenas.
Porém, o Conselho de Gestao Ka’apor afirma que não vão esperar pelo governo para proteger seu território. Eles próprios tem garantido a proteção dele para poderem executar seu plano de vida conforme determina a floresta.
Nesse sentido, o Conselho de Gestão Ka’apor conclama a todos os cidadãos a lutarem contra as leis e medidas autoritárias e anti-indígenas do Governo Temer, contra a regularização dos territórios de outros povos no Brasil e pela defesa dos Territórios e das Florestas. Pois, a cada dia que passa aqui na região os “cupins” seguem enfileirados aliciando jovens e adultos pobres e desempregados da periferia e do campo na região a se tornarem mão de obra barata nas frentes de exploração madeireira, seja na derrubada, no transporte e no beneficiamento nas serrarias clandestinas no entorno ou no interior da terra indígena. Ressaltando que as noites e as madrugadas são horários preferidos para a pratica desses ilícitos e grande parte do beneficiamento tem sido realizado no interior do território onde se tem deslocado equipamentos para facilitar o transporte mais rápido das cargas, sejam em caminhões abertos, mas cobertos com lonas ou caminhões fechados. Conforme a Guarda Florestal Indígena já chegam a (6) seis o numero de ramais reabertos nos municípios de Zé Doca, Araguanã, Nova Olinda do Maranhão, Centro do Guilherme e Centro Novo do Maranhão.
Na foto, a liderança Eusébio Ka’apor durante protesto pela proteção do território. Eusébio foi assassinado em 26 de abril de 2015

quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

Os sem-terra desafiam a gigante Vale na Amazônia

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Agricultores do Pará ocupam áreas que dizem ter sido compradas ilegalmente pela mineradora. Com isso, começam a desfazer um emaranhado confuso sobre a titularidade de terras na região
Talita Bedinelli – El País
De um pequeno escritório de paredes encardidas e goteiras no telhado, uma dupla de advogados monta, há dois anos, um quebra-cabeça de pequenas peças que parecem difíceis de encaixar. De uma das salas, retiram um mapa gigante, esticam-no sobre uma mesa e apontam para retângulos que delimitam terrenos de Canaã dos Carajás, município do sudeste do Pará onde a Vale desenvolve projetos bilionários de extração de cobre, ferro e outros minérios. “Isso aqui é terra pública. Isso aqui também. E a Vale comprou sem o Governo saber”, acusa José Batista Afonso, advogado da Comissão Pastoral da Terra (CPT). Ele é responsável por aquela espécie de bunker dos excluídos, que atende casos complexos de disputa de terra, localizado em Marabá, cidade ligada a Canaã por uma estrada que contorna extensas fazendas de gado e terras que exalam a queimada e agrotóxico.
Há dois anos, ao lado da também advogada Andreia Silverio, ele tenta comprovar que uma das maiores mineradoras do mundo se aproveitou por décadas de um vácuo da fiscalização para adquirir irregularmente terras da União, muitas delas ocupadas por assentados do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), para viabilizar seus projetos de extração de minério na Amazônia, ilegalidade que a Vale nega. Mas nos últimos meses, através de uma estratégia montada por agricultores, eles começaram a montar algumas dessas peças.
Em junho do ano passado, os sem-terra passaram a ocupar terras adquiridas pela Vale. Sabiam que, em 2010, a empresa havia sido obrigada a indenizar o Incra em quase 6 milhões de reais pela compra de 80 lotes de assentamento sem autorização do órgão fundiário em outra área do Pará. E muniam-se de um levantamento feito pelo Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Canaã dos Carajás, que aponta indícios da venda de 199 lotes de reforma agrária na região.
A estratégia foi entrar nas áreas, construir casas de madeira e iniciar suas roças. Com isso, forçaram a empresa a acionar a Justiça para tentar removê-los. Como parte do processo, a mineradora teria que anexar uma comprovação de que é, de fato, dona dessas propriedades e, com isso, eles acreditavam que seria possível começar a desfazer o emaranhado de dúvidas que envolve a titularidade dessas terras. “Só queremos que provem pra gente que a Vale comprou tudo de forma legal. Enquanto isso não acontecer, não vamos desistir”, explica José Raimundo Garcez Anges, o Raimundão, um ex-garimpeiro de 54 anos que coordena o acampamento Grotão do Mutum, o primeiro montado, em 13 de junho de 2015.
Depois desse grupo, ao menos outros cinco entraram em áreas compradas pela Vale, cada um deles englobando diversos lotes de terra. Segundo o pesquisador Bruno Malheiro, que realiza um doutorado na Universidade Federal Fluminense (UFF) sobre as terras adquiridas pela mineradora, a empresa entrou, até agora, com 39 pedidos de reintegração de posse na área de Canaã dos Carajás por ocupações feitas em terras dela –em algumas, obteve êxito, como no caso da fazenda ocupada pelo grupo de Raimundão, que já foi despejado. Um mesmo acampamento pode ter mais de um processo, já que as liminares são feitas contra as pessoas que ocupam os lotes e não contra o acampamento.
Nos processos de reintegração há documentos anexados pela Vale que mostram que algumas das áreas adquiridas eram terras de posse de quem as vendeu. Para ajudar no processo judicial, os advogados dos sem-terra também questionaram o Incra sobre as terras ocupadas por quatro dos acampamentos neste último ano. O órgão fundiário federal afirma que entre as áreas pleiteadas por eles há lotes privados, mas também públicos (leia mais no quadro abaixo).

“Vendi terras para a Vale”

Dois agricultores de Canaã dos Carajás asseguraram para a reportagem que terras recebidas por eles em assentamentos do Incra, ou seja, públicas, foram compradas pela mineradora. Um deles é o próprio presidente do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Canaã dos Carajás, que hoje auxilia as ocupações de sem-terra feitas em áreas adquiridas pela Vale. “A minha terra era rica em minério. Um dia chegou um geólogo e disse que ela era necessária. A Vale propôs comprar, eu falei que não vendia. Aí o fazendeiro que fazia divisa comigo pediu para eu trocar meu lote por outro dele, em outra área, e eu troquei”, conta José Ribamar da Silva Costa, o seu Pixilinga, assentado na quadra 31, lote 28, do Projeto de Assentamento Carajás II e III. “Eu não tinha o título de posse daquela terra, só o de ocupação. E lá dizia que a terra era inegociável. Menos de um ano depois, o fazendeiro vendeu minha terra para a Vale, junto com a dele. Já estive no Incra várias vezes depois disso e eles me disseram que eu ainda sou assentado. Puxei o espelho da minha terra e está lá direitinho”, afirma. O Incra confirma que seu Pixilinga ainda figura na lista de assentados do Incra.
Manoel Batista da Silva é outro desses casos. Conhecido na região como Manoel Colono, ele é apontado por vários agricultores de Canaã como “o homem que vendeu três terras para a Vale”. Na década de 80, quando mudou para a cidade, ele não tinha nada. Hoje, é dono de uma fazenda milionária, visitada pela reportagem. Ele afirma que foi assentado pelo Incra, inicialmente, em uma terra onde hoje funciona o projeto de extração de cobre Sossego, da Vale.
“Recebi essa terra do Incra em 1984, com cerca de 10 alqueires. Eu tirei o título dela, mas depois eu comprei mais 10 alqueires do companheiro que fazia divisa comigo, também assentado e que não tinha título. A maioria das áreas aqui da região não tem documento mesmo”, justifica. “Na região do Sossego tinha ouro. A gente tirava no garimpo de 20 a 30 quilos por semana”, afirma ele, que na época chegou a arrendar parte de sua terra para uma pequena vila de garimpeiros. “Aí a Vale chegou com a proposta, lá para 1999. Vendi os meus 20 alqueires para ela por 110.000 reais”, assegura ele. A mina do Sossego rendeu à mineradora, só no terceiro trimestre deste ano, um lucro, sem contar impostos, de 32 milhões de dólares (cerca de 108 milhões de reais).
Com os 110.000 reais, Manoel comprou outro terreno, que também não tinha título. Mas, dois anos depois, em 2001, a Vale precisou da área para fazer uma represa para a mina Sossego, conta ele. “Vendi os 25 alqueires por 330.000 reais. Eles até procuravam saber se tinha título. Mas se não tinha compravam também”, afirma, na frente de moradores que confirmam a história. Com o novo dinheiro, Manoel comprou outra área. Desta vez, não era terra do Governo, mas de posseiros que também não tinham o documento, diz. Segundo o Governo federal, terras não tituladas são consideradas públicas. “Quando vi, começaram a fazer pesquisa [mineral] lá dentro.” Em 2006, a mineradora o procurou novamente, de acordo com ele. Agora precisava das terras para o projeto Níquel do Vermelho, que ainda não está em operação. “Pelos 63 alqueires, a Vale pagou 2,1 milhões de reais”, diz Manoel, que com o dinheiro comprou outro terreno. “Por enquanto, ainda não falaram mais nada de mineração nessa minha área”, brinca.
Em caso de interesse em uma área de assentamento do Incra, a Vale deve negociar diretamente com o órgão federal e indenizá-lo, para que um novo assentamento seja feito para acomodar as famílias. Aos agricultores que a ocupam, ela deve pagar pelas benfeitorias da terra -casa e roça, por exemplo. A Vale nega que tenha cometido qualquer irregularidade na aquisição de terras na região (leia ao lado). A reportagem questionou a mineradora sobre as alegações feitas por Manoel e Pixilinga, mas ela não quis comentar os casos específicos dos dois agricultores. O Incra afirma que só fiscaliza suspeitas de vendas irregulares de terras de assentamentos quando há denúncia formal no órgão.

Perseguição e insegurança

A vida dos acampados em terra da Vale é rodeada de insegurança. O grupo de Raimundão, do Grotão do Mutum, foi o primeiro e único, até agora, a ser despejado em 3 de fevereiro deste ano, mas há outras reintegrações de posse dadas pela Justiça e ainda não cumpridas.
No Grotão do Mutum, cerca de 400 famílias permaneceram na área por nove meses, tempo que usaram para organizar uma ampla roça, nos cerca de 8.000 hectares ocupados. A reintegração de posse chegou ao local acompanhada por vários carros da polícia. As famílias, que afirmam que foram pegas de surpresa, tiveram que deixar para trás tudo o que arriscaram plantar, já em ponto de colheita para a venda. “Eu tinha oito linhas de arroz, tudo na última palha, para colher. No dia que o despejo chegou, um camarada me falou: ‘Rapaz, vamos ali na sua roça tirar pelo menos esse caminhãozinho de abóbora’. Eu tinha 570 pés de abóbora. Fomos lá, eu vendo as minhas coisas tudo se acabando, eles metendo o trator em tudo. Conseguimos salvar 70 abóboras”, conta Dionísio da Conceição, de 67 anos.
“Eu saia para a roça de manhã com uma garrafinha d´água e um pouquinho de farinha e voltava às três horas da tarde. Me diziam: “Rapaz, tu é doido! Vai morrer aí de fome com esse negócio de roça!’ Lutei muito para fazer essa roça. Quando estava feita aconteceu esse negócio”, lamenta. Os agricultores reclamam que toda a comida produzida foi destruída ou dada para animais. Queriam, ao menos, ter podido colher o que plantaram. A mineradora afirma que a primeira intimação foi dada ao acampamento em junho de 2015, o que eles negam. “Na ocasião, os ocupantes decidiram não sair do imóvel. Então, o Poder Judiciário oficiou o Comando da Polícia Militar para cumprimento da reintegração, o que foi executado pelo oficial de Justiça e a Tropa Especial da Polícia Militar em fevereiro de 2016, oito meses depois da primeira intimação para desocupação voluntária do imóvel”, afirmou, em nota. As famílias ainda esperam voltar para a Fazenda São Luís, de onde foram expulsos, que a Vale comprou para fazer compensação ambiental pelo S11D, que entrará em funcionamento nos próximos meses e promete ser o maior projeto de extração de ferro do mundo. O Incra afirma que uma parte da área reivindicada pelas famílias há terras públicas.
A reintegração de posse do Mutum alarmou os demais acampamentos. No Rio Sossego, área pleiteada por 54 famílias e ocupada em 10 de outubro do ano passado, só agora os acampados estão começando a plantar, assustados com a possibilidade de perderem tudo. A área tem vistas para o projeto Sossego, a mina de cobre da Vale, e fica no entorno do S11D.
Denislai de Souza Brito, de 25 anos, coordena este acampamento. Ele é neto de um agricultor pernambucano que, na época da ditadura militar, foi atraído pela proposta do Governo de colonizar a Amazônia. Seu avô tinha o título da terra e, na década de 1990, foi procurado por funcionários da Vale que buscavam terras para implantar o projeto Sossego e as vendeu. “Disseram para ele que se ele não negociasse iam perfurar a terra por baixo. Como ninguém tinha conhecimento, não sabia de nada, ele ficou com medo e, por pressão, decidiu vender”, conta.
Agora, Denislai e o irmão buscam um pedaço de terra. “Eu tinha uma paixão em trabalhar na área da Vale. Mas era uma ilusão muito forte. Os jovens que trabalham para a mineradora foram trazidos de fora. Até um trainee que eu tentei fazer, não consegui. Se a área da Vale para emprego é a Vale e eu não posso me empregar…”, diz. “Comprar uma terra hoje eu garanto que a gente não consegue comprar, não tem como. Tudo inflacionou com a chegada da mineradora. Mas com um pedaço de chão, podemos produzir nosso alimento”, conta.
Ele afirma que se sente intimidado na área. “Onde a gente está, estão vigiando. Aqui já avistamos um drone sobrevoando. O helicóptero passa e essas árvores ficam balançando. Eles sobrevoam por uns 10 minutos, tirando foto, filmando”, conta. A própria reportagem vivenciou o clima de espionagem: ao acompanhar uma marcha de sem-teto em Canaã dos Carajás, no mês passado, foi fotografada por pessoas que estavam dentro de um carro de vidros escuros sem identificação. Não foi possível saber quem estava dentro.
Com a falta de informação clara sobre a situação fundiária das áreas adquiridas pela Vale, a tensão causada na região aumenta a cada dia. O Pará é um dos Estados brasileiros campeões de conflitos no campo, com 99 áreas em disputa em 2015, segundo levantamento da Comissão Pastoral da Terra. No último dia 17 de novembro, uma nova tentativa de ocupação da Fazenda São Luís, agora por outro grupo que não o do Grotão do Mutum, acabou em um confronto com troca de tiros que deixou feridos entre os seguranças da mineradora e os agricultores.

VALE AFIRMA QUE AQUISIÇÕES FORAM LEGAIS

T.B
A Vale afirmou por email que todas as aquisições ou indenizações de áreas de servidão minerária seguem regras definidas na legislação vigente. “A Vale acredita que a reforma agrária é fundamental para o desenvolvimento do Brasil de forma igualitária. Ao mesmo tempo, acredita na capacidade de atuação das instituições responsáveis, como o Incra, para dar solução a esta questão de modo justo e legal.”
A empresa disse ainda que “todas as aquisições seguem o princípio de indenizar de forma justa as pessoas que ocupam as áreas, o que abrange benfeitorias e direitos, sejam eles posse e/ou domínio”, ressaltou. “Em caso de imóveis geridos pelo Incra, a Vale sempre adotou medidas destinadas a compensação de eventuais prejuízos.” “A Vale mantém diálogo sistemático com o Incra no sentido de nivelar todos os processos fundiários envolvendo assentamentos”.
Questionada pela reportagem do porque não ter havido um acordo com o Incra para reassentar famílias do Projeto de Assentamento Carajás II e III, a mineradora respondeu: “A servidão mineraria foi instituída nessas áreas por ser a atividade de mineração de interesse nacional e utilidade pública. A Vale pagou a indenização aos superficiários através de acordos judiciais e extrajudiciais. Importante destacar que a servidão mineraria não implica em perda da propriedade ou posse, sendo apenas ônus incidente em imóvel privado ou público.”

O QUE JÁ SE SABE SOBRE AS TERRAS

A empreitada dos sem-terra e de seus advogados para comprovar possíveis irregularidades nas aquisições de terras é uma missão difícil porque a situação fundiária do Pará é, desde início de sua ocupação, muito complicada. Na área, há vários recortes de lotes em situações variadas, desde aqueles grilados por posseiros, que depois de anos conseguiram título de propriedade, até aqueles de assentamentos da reforma agrária, que são da União. Às vezes, esses lotes de situações jurídicas diversas são vizinhos, o que complica ainda mais a tentativa de se fazer uma radiografia completa e comprovar as suspeitas.
“Nós reivindicamos que o Incra fizesse o levantamento da situação de toda essa região. É uma área de implantação de projetos bilionários da Vale. Sabendo que a mineradora está comprando todos os imóveis e que há terras que incidem em áreas de reforma agrária, o que justifica que o órgão fundiário não queira ter um levantamento sobre a situação do entorno desses projetos? Por que não há o interesse em manter seu patrimônio? Por que as famílias sem-terra precisam forçar o Incra a isso?”, afirma Batista, o advogado da Comissão Pastoral da Terra de Marabá.
Não se sabe com exatidão quais terras a Vale comprou na região e só ela pode passar essa informação -o que vem fazendo, indiretamente, com as ações na Justiça. Esses dados, depois, precisam ser cruzados com as informações do Incra e do Ministério do Desenvolvimento Agrário para que se saiba quais áreas não têm títulos de propriedade, o que indica que são públicas. Ninguém pode adquirir essas terras sem a permissão do Governo. Questionados pela reportagem, tanto o Incra quanto o ministério afirmaram que não fizeram qualquer acordo para que a Vale adquira terras públicas na cidade. “O Incra não foi informado previamente pela Vale, por assentados, associações ou sindicatos sobre a compra de lotes. Assim, não há como precisar o número de lotes negociados”, disse o órgão, quando questionado.
Entre os documentos anexados pela mineradora na Justiça para os processos de reintegração de posse há registros de “promessa de compra e venda” da área adquirida, onde se afirma que os vendedores da terra dispõem de “posse mansa e pacífica da área”. No memorial descritivo de uma dessas terras há a afirmação de que uma parte dela se refere a “posse de área da União”.
Provocado pelos movimentos sem-terra, o Incra começou a dar respostas. Há dois meses, o órgão afirmou que a área onde estão dois dos acampamentos possuem terras tituladas e, por isso, se foram compradas pela Vale esse processo foi regular. Mas nos 8.000 hectares da área da Fazenda São Luis, de onde o grupo de Raimundão foi despejado, há pouco mais de 715 hectares de terras públicas, referentes a lotes do Projeto de Assentamento Carajás II e III que não têm título definitivo. Ou seja, estas terras, se de fato foram vendidas para a mineradora, não poderiam ter sido.
Também respondeu que na área de outro acampamento, do Rio Sossego, identificou apenas um título outorgado e, assim, o restante da área não tem título. Na área de dois outros acampamentos, cuja situação fundiária foi questionada pelos advogados, não há terras públicas, destacou o Incra.
Segundo o Incra informou à reportagem, esse projeto de assentamento, criado na década de 1980, é constituído de 1.368 lotes. Destes, 535 não possuem título de propriedade e, por isso, pertencem à União, que não tem informações sobre as aquisições feitas pela empresa. Por e-mail, o órgão afirmou o seguinte: “A Vale comprou em sua maioria lotes titulados do projeto [de assentamento]. Não temos o total de área e quais lotes foram comprados pela empresa, porque as compras foram in-loco. Até que surjam denúncias, não existe uma maneira de identificar que o lote dentro do projeto foi vendido.”
Além das terras em assentamento, nesse mosaico confuso da titulação de terras também existem áreas que são consideradas públicas porque nunca tiveram sua situação regularizada. Pertenciam, por exemplo, a posseiros que nunca tiraram os títulos ou a colonos que foram levados para a Amazônia na época da ditadura militar pelo extinto Grupo Executivo das Terras do Araguaia-Tocantins (GETAT) e que nunca foram atrás do documento. Essas terras também não podem ser comercializadas.
Para tentar regularizar as áreas ocupadas e não tituladas da Amazônia o Governo Federal criou em 2009 o programa Terra Legal, gerido pelo Ministério de Desenvolvimento Agrário. Questionada pela reportagem sobre as denúncias na região, a assessoria de imprensa do programa afirmou que, em 2015, tomou conhecimento de que a Vale havia adquirido “os direitos possessórios [de posse] de ocupantes de terras públicas federais”, em uma área reivindicada pelos sem-terra com o objetivo de fazer a compensação ambiental do projeto de extração de ferro S11D.
“Ao analisar a situação fundiária da área, foram identificados títulos expedidos pelo programa Terra Legal”, ressaltou, em nota. O órgão investiga, agora, os títulos de 15 áreas, que afirma estarem sob suspeita. O objetivo é saber se foram, de fato, vendidas para a Vale, o que só poderia acontecer, segundo a lei, após dez anos da emissão desses documentos, tempo que ainda não transcorreu. Também investiga se os próprios títulos foram expedidos de acordo com a lei. No ano passado, uma quadrilha de servidores que atuava no programa nesta região foi presa sob suspeita de comandar um esquema de fraude para conceder títulos de terras em situação irregular, mediante o pagamento de propina. A investigação iniciada há um ano ainda não foi concluída, afirma o ministério. “Há aqui uma tradição da ilegalidade, de uma prática impune que faz com que a Vale continue se beneficiando”, desabafa Batista. “É a certeza da impunidade”.
Foto: Projeto de mineração da Vale visto de um acampamento de agricultores. VICTOR MORIYAMA

quinta-feira, 8 de dezembro de 2016

Pistoleiros invadem T. I. Alto Turiaçu, Maranhão. Ka’apor fazem um prisioneiro. Autoridades se omitem


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Tania Pacheco
Pistoleiros invadiram há pouco a Terra Indígena Ka’apor de AltoTuriaçu. Os indígenas reagiram e conseguiram imobilizar um dos invasores, que está retido na ramada (centro) da aldeia Zé Gurupi neste momento.
Chamada, a polícia civil de Zé Doca alegou só ter uma viatura e disse que “talvez” às 15:00 mandasse um carro para a aldeia, “sem certeza”. Até o momento, ninguém apareceu.
Os Ka’apor temem reação de madeireiros nas próximas horas. Corre a notícia de que os invasores estão armados nas estradas de acesso à aldeia Zé Gurupi, e há temor de emboscadas.
Há cinco dias, guardas florestais indígenas abordaram madeireiros dentro do território e confiscaram quatro motos, depois devolvidas ante ameaças de mais violência.
Os Ka’apor já tentaram contato com a Procuradoria da República no Maranhão, o Ibama e a Polícia Federal, até agora sem sucesso.
Resumindo: continua extremamente tensa e preocupante a situação dos povos indígenas no Maranhão, assim como se mantém a omissão das autoridades distas competentes. Quantos mais devem morrer, antes que as leis sejam respeitadas nesta republiqueta?

Contas pendentes

Um dos casos mais chocantes envolvendo a inércia das chamadas autoridades em relação a esse povo indígena é o de Irauna Ka’apor, de 14 anos, sequestrada por madeireiros em fevereiro e até hoje desaparecida. As noticias mais recentes dão conta de que ela estaria sendo mantida num acampamento madeireiro na divisa com o Pará. Há um mês, a Funai prometeu que iria resgatá-la. Neste caso, os Ka’apor (e Irauna) continuam esperando. Mas a verdade é que nem sempre a paciência prevalece…
No que diz respeito à saúde, a situação não é menos grave. Semana passada, os Ka’apor ocuparam o Pólo Base de Zé Doca. Como eles dizem, “o descaso na saúde fez mais uma vítima: a jovem Socorrin Ka’apor, 26 anos, mãe de cinco crianças e moradora da Aldeia Ximborenda, a maior aldeia do território indígena Alto Turiaçu”. Socorrin morreu num hospital de São Luiz, depois de ter sido devolvida duas vezes para sua aldeia pelos responsáveis pelo Pólo Base de Zé Doca. De acordo com o desabafo dos Ka’apor,
“Esses funcionários do Pólo Base não falaram a verdade para a família da jovem. Primeiro, falaram que estava com infecção urinária. Depois, falaram que morreu de pneumonia. O descaso do Pólo Base de Zé Doca fez as estatísticas de óbitos duplicarem em relação ao ano de 2015 quando o conselho de gestão Ka’apor tinha participação direta e acompanhava. (…) Estruturaram o pólo base só pra eles trabalhar melhor e os nossos parentes nas aldeias ficarem na pior, sofrendo, morrendo. Não tem medicamentos para os casos graves, não tem postos de saúde na maioria das aldeias, não tem técnicos em todas as aldeias, não aceitam tratar os parentes com pajés, não tem consultas para especialistas, e muitas coisas para nossos parentes viverem com saúde. (…) É a sexta morte por omissão e descaso.”
Finalmente, não custa relembrar que o assassinato de Eusébio Ka’apor, importante liderança na luta pela território que foi morto em 26 de abril de 2015, continua sem qualquer punição. 
Brasil…
Destaque: O pistoleiro imobilizado na Aldeia Zé Gurupi. Foto: Ka’apor

Almoço da bancada ruralista tem ira de deputados e expulsão de repórtere


Almoço da bancada ruralista tem ira de deputados e expulsão de repórteres

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De Olho nos Ruralistas esteve na mansão em Brasília onde Frente Parlamentar da Agropecuária se reúne todas as terças; equipe foi retirada à força após fazer perguntas
Por Alceu Luís Castilho, no De olho nos Ruralistas
Uma mansão em estilo modernista sedia, todas as terças-feiras, um almoço promovido pela Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA). Não se trata de um segredo. Ele é divulgado nas redes sociais, com menções a órgãos de imprensa – o próprio De Olho nos Ruralistas já foi citado nesses posts – e a apresentação do que eles chamam de “cardápio do dia”: a CPI da Funai, por exemplo; ou a venda de terras para estrangeiros; as dívidas dos agricultores. E assim por diante.
Nesta terça-feira (29/11), o cardápio era a eleição para o próximo presidente da Câmara. A bancada ruralista sempre pensa alto. Em julho, quem esteve nesse almoço foi o presidente Michel Temer. Em agosto, o então ministro Moreira Franco, responsável pelas parcerias para investimentos. As autoridades federais participam de um almoço específico para parlamentares, enquanto a imprensa aguarda a saída de cada um, logo na primeira sala, para entrevistas.
Por ali passam prefeitos e lobistas. Logo na entrada, um quadro com texto do jornalista Reinaldo Azevedo, em defesa dos ruralistas. Ele diz que os ruralistas “apanham de todo mundo”: das esquerdas, dos índios, da imprensa. E se refere aos que se preocupam com o aquecimento global como “fanáticos”. Para Azevedo (e a FPA), o Brasil é um país onde “os que produzem riquezas são alvo da fúria dos que produzem discursos”.
Quadro com texto do jornalista Reinaldo Azevedo, em defesa dos ruralistas
Quadro com texto do jornalista Reinaldo Azevedo, em defesa dos ruralistas
Os parlamentares vão chegando, aos poucos, sorridentes. Logo vemos o ex-deputado Odacir Zonta (PSB-SC), chocado com a morte dos jogadores da Chapecoense. “É meu time”, lamenta o político da região, enquanto recebe os pêsames de algumas pessoas. “O time é patrocinado pela cooperativa de carnes Aurora”, observa. Zonta já presidiu a Frente Parlamentar do Cooperativismo e coordenou as propostas do setor para a candidatura presidencial de Eduardo Campos, em 2014. Ele entra na área reservada aos parlamentares.
Os jornalistas que frequentam o local são profissionais que cobrem com regularidade o setor agropecuário. Alguns vão lá toda semana. Outros são assessores dos parlamentares. As conversas dos que não são jornalistas giram em torno de dinheiro. Na fila para o almoço, um deles destaca as vantagens de investimentos tecnológicos na produção de soja. Outro explica por que não é vantajoso plantar grãos. “Abacaxi é muito melhor”, avalia.
O almoço tem salada (alface, tomate, pepino), costela de porco, uma carne assada, arroz, arroz com calabresa, feijão, tutu, miho, batata, mandioca. Sobremesa: doce de leite, mamão, manga, melão. E abacaxi. Suco de uva e suco de caju, em caixinha.
Mais um tempo de espera e começam a sair os deputados. Duas jornalistas de televisão entrevistam o deputado Alceu Moreira (PMDB-RS). Esperamos suas perguntas (sobre CPI da Funai, Cadastro Ambiental Rural) e fazemos as nossas. O deputado responde, mas vai ficando cada vez mais nervoso, diante de perguntas que o incomodam. Como esta: “Deputado, essa defesa do interesse nacional dos produtores não é contraditória com a defesa da venda de terras para estrangeiros?”
A entrevista e a reação do deputado podem ser vistas aqui:
Moreira diz que o ministro do Meio Ambiente, Zequinha Sarney, “não manda nada” no governo. Após uma pergunta sobre as ONGs internacionais, criticadas de modo virulento pelo deputado (“As ONGs internacionais são bolivarianas?”), Moreira decide que não vai mais responder os questionamentos, que passa a definir como “provocação”. “O senhor não faz pergunta, faz provocação”. E vai embora.
Em seguida vem o chefe da assessoria de imprensa da FPA, jornalista Tito Matos. Pergunta de onde somos, mostro o crachá: “Alceu Castilho, editor – De Olho nos Ruralistas”. Continuamos conversando, cordialmente, enquanto o deputado Luis Carlos Heinze (PP-RS) fala com os jornalistas de TV. Dirijo-me novamente à rodinha e, igualmente quando encerram as perguntas, faço as minhas.
Diante de uma pergunta sobre mudanças climáticas (estávamos lá justamente por causa de uma pauta com essa temática), Heinze joga a pasta e os papéis que segurava numa mesa ao lado, com força, e se dirige a mim, entusiasmado. Critica a legislação brasileira, diz que o observatório “representa ONGs internacionais” e conta que não acredita em aquecimento global. “Estou esperando que Donald Trump faça a parte dele, pois também é contrário”. E sai.
A entrevista com o deputado Heinze pode ser vista aqui:
Olho para o cinegrafista e pensamos: vamos ou não embora? Mas decidimos esperar a saída do presidente da Frente Parlamentar, deputado Marcos Montes (PSD-MG). Ele estava na porta da outra sala – onde só os parlamentares têm acesso. Sou abordado por outro assessor de imprensa, Lucio Haeser, que se lembra de mim. Quando eu era repórter da revista IstoÉ Dinheiro, participamos de uma mesma viagem aos Estados Unidos.
Conversamos sobre amenidades, sobre aquela viagem. E sobre o nosso trabalho – o dele e o do De Olho nos Ruralistas. Explicamos que estamos à disposição para publicar as versões da FPA, sobre os temas abordados pelo observatório, caso vejam necessidade. Pois fazemos jornalismo. O clima, agora, é de absoluta cordialidade. Apresento o nosso coordenador de projetos, André Takahashi, que faz a função de cinegrafista e…
… eis que de repente levo um tranco. Um grandalhão pega no meu braço, me empurra em direção à porta e começa a bradar: “Saia desta casa agora!”
Ninguém reage. Nem os assessores de imprensa, nem os demais jornalistas. Apenas Takahashi, que tenta ligar a câmera e é impedido por um jovem de terno. O jovem tenta quebrar a lente da câmera e empurra o cinegrafista em direção à porta, enquanto o primeiro homem diz que aquela é sua casa e que não tínhamos sido convidados.
Pergunto seu nome. Ele não responde. Ele continua dizendo para que saiamos imediatamente. Diz que vai chamar a polícia. Eu pergunto: “Quem é o senhor?” E tento argumentar – em situação de coação – que aquilo é a reunião de uma Frente Parlamentar, pública. Digo ao assessor de imprensa que quero falar com o presidente, deputado Marcos Montes. Mas o dono da casa se mostra irredutível.
Sou acompanhado até a porta pelo assessor, Tito Matos. Pergunto por Haeser, mas não o vejo mais. E continuo dizendo que quero falar com Montes – até para perguntar se ele banca a atitude do grandalhão. O assessor do deputado deixa um cartão. Mas Montes diz que não adianta dar entrevista, pois iríamos “distorcer tudo”.
O homem que nos expulsou chama-se João Henrique Hummel. É diretor executivo da Frente Parlamentar da Agropecuária.

sábado, 3 de dezembro de 2016

Vale: prioridade aos dividendos


A Vale deverá investir no próximo ano 1,1 bilhão de dólares a menos do que o previsto para este ano. É uma redução de 20%, de US$ 5,6 bilhões para US$ 4,5 bilhões, conforme as projeções apresentadas ontem pela mineradora na Bolsa de Valores de Nova York.
Haverá nova queda em 2019, para US$ 4 bilhões, com uma estabilização em US$ 4,5 bilhões em 2018. Esse programa de investimento quadrienal inferior a US$ 20 bilhões coloca a Vale  em patamar abaixo do nível das outras mineradoras do mundo. A tendência decrescente não deverá se inverter tão cedo, já que para 2021 a previsão de investimento é de US$ 2,9 bilhões.
A perspectiva desfavorável se acentua porque de 2012 a 2016 os gastos com investimento da mineradora caíram 65%, depois de atingirem, naquele ano, seu ponto máximo, de US$ 16,2 bilhões.
Há ainda um agravante, conforme o comunicado da companhia: seus investimentos nos próximos anos serão feitos principalmente em manutenção e reposição da sua capacidade de produção. O presidente da Vale, Murilo Ferreira, procurou atenuar o quadro ressaltando que a implementação bem-sucedida de projetos, aliada à disciplina na alocação de capital, permitiu a redução dos investimentos.
O efeito dessa iniciativa foi atender o mercado acionário, que a Vale acha que lhe foi muito exigente – e ameaçador, sedento pór dividendos. A partir de 2017 a expectativa é de que o caixa passe a ter um fluxo positivo para atingir mais de US$ 19 bilhões em 2021.
Isso, apesar de a Vale ter que abater US$ 12,4 bilhões da sua dívida entre 2017 e 2020, o que não assusta os seus executivos, segundo a exposição feita em NY.
Eles preveem que se o preço do minério de ferro se mantiver nos atuais US$ 50 a tonelada, a distribuição de dividendos pode atingir níveis mais altos e a dívida se reduzirá. Com o preço a US$ 60, a distribuição dos dividendos será maior e a dívida se reduzirá mais rapidamente.
Durante esse período, a Vale vai manter sempre um piso de 400 milhões de toneladas por ano, atingindo 450 milhões no início da nova década, em 2021. Nesse momento, Carajás representará mais da metade do total, contribuindo com 230 milhões de toneladas de um minério mais rico do que qualquer outro, inclusive o de Minas Gerais, que ficará em segundo lugar pela primeira vez.
Será o auge da capacidade da nova mina, de S11D, que já começará a produzir em janeiro do próximo ano, sem que os paraenses se deem conta de que é o maior investimento do setor mineral em todo mundo e a última grande incorporação de jazida feita pela Vale.
Para pagar a imensa dívida deixada pela década de Roger Agnelli na presidência e contestar os detentores de papeis da companhia, que nela aplicaram suas economias, a Vale só encontra um caminho:incrementar a extração de minério, esgotando a jazida de Serra Sul em 40 anos.
Não foi por acaso que a mineradora brasileira fez o anúncio em Nova York e não – também – em São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Belém. Os mais numerosos acionistas com preferência ao recebimento de dividendos compraram seus papéis na Bolsa de Valores novaiorquina.
De lá saiu muito dinheiro e para lá retornará, multiplicado. Os paraenses continuarão a ver esse movimento como a parte invisível das idas e vindas dos imensos trens, que levam o precioso minério de Carajás para o mundo, numa viagem que não tem volta.