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David
Harvey provoca, em longa entrevista: é hora de adaptar ambiente urbano ao tipo
de gente que queremos ser
Entrevista
a Vince Emanuele | Tradução: Sônia Scala Padalino – Outras Palavras
Se
vivemos em cidades que nos infernizam e aprisionam, qual a causa de sua
desumanidade? E, mais importante: que caminhos permitirão transformá-las? As
respostas, para esta questão crucial, raramente coincidem. Às vezes, são
genéricas demais e paralisam: núcleos urbanos insuportáveis seriam consequência
necessária de um sistema que coloca o lucro acima dos seres humanos. Só o fim
do capitalismo abriria espaço para novas cidades. Em outros casos, as respostas
são muito pouco ambiciosas. Diante de adversários poderosíssimos – o poder
econômico e uma política institucional cada vez mais impermeável às aspirações
sociais – deveríamos nos concentrar em humanizar espaços restritos. Uma bairro,
uma praça, uma horta comunitária.
Acaba
de percorrer três cidades brasileiras – Rio, Florianópolis e São Paulo – David Harvey, um
pensador que busca, há décadas, soluções para este impasse. Geógrafo, Harvey é
também marxista. Para ele, portanto, o degradação das cidades está associada ao
capitalismo.
Mas
este britânico de 77 anos não se satisfaz com conclusões fáceis. Seu desafio
intelectual tem sido, desde que se dedicou ao estudo da urbanização, localizar
os mecanismos precisos por meio dos quais as relações capitalistas deterioram a
cidade. Harvey sabe que identificar tais mecanismos ajudará a revertê-los; ao
passo que repetir chavões poderá, no máximo, satisfazer egos.
Sua
investigação o tem levado a conclusões importantes. Por trás de movimentos
aparentemente contraditórios – em certos momentos, o centro das metrópoles
esvazia-se, para se supervalorizar e aburguesar, no período seguinte –, há
necessidades específicas relacionadas à acumulação de capital. Nos EUA, por
exemplo, os centros foram abandonados a partir da década de 1950 (morar em
Manhattan era baratíssimo…), quando esgotou-se o esforço de guerra e o sistema
precisou realocar recursos na indústria automobilística, abertura de estradas e
construção imobiliária intensa nos subúrbios. Trinta anos depois, uma nova
supremacia (a dos mercados financeiros) estimulou uma volta às Velhas Cidades.
Na primeira fase, agrediu-se a natureza. Na segunda, expulsaram-se os pobres…
Em
certos momentos, prossegue Harvey, torna-se possível romper esta lógica. Para o
geógrafo, a Comuna de Paris (1871) não foi apenas uma tentativa de expropriar a
burguesia, mas a busca de “uma nova vida cotidiana, em reação ao
desenvolvimento especulativo e consumista da classe alta”. Mas não é preciso
esperar por estas rupturas, para começar a reinventar a cidade.
Harvey
sabe que “o replanejamento é algo de longo prazo”. Por isso, valoriza também
processos aparentemente menos radicais. Por exemplo, a invenção dos Orçamentos
Participativos, que foram mantidos em Porto Alegre por cerca de dez anos, na
virada do século. O decisivo é negar a lógica que reduz a cidade a um mero
território de valorização capitalista e começar a fazer perguntas: “Como deve
ser nossa relação com a natureza? Que tipo de urbanização queremos”?
Em
sua passagem pelo
Brasil, David Harvey fez palestras e lançou a primeira versão em
português de uma obra antiga: “Os limites do capital”, publicado em 1982. A entrevista a
seguir foi feita há alguns meses, por uma rádio alternativa dos EUA (“Veterans’ Unplugged”)
e debate uma obra mais recente: “Rebel Cities”
(2012), ainda sem tradução em português (embora tenha inspirado a coletânea
brasileira “Cidades Rebeldes”,
sobre os protestos de junho). É abordando este tipo de mobilização, aliás, que
o geógrafo encerra sua conversa. “O conselho que dou a todos é ir para as ruas
o mais possível, enfrentar a desigualdade social e a degradação ambiental. (…)
Gostaria que as pessoas se tornassem ativas, avançassem. Esse momento é
crucial. O grande capital não cedeu em nada até agora. Precisamos produzir um
impulso enorme se quisermos ver algo diferente em nossa sociedade”.
No
prefácio de Cidades Rebeldes, você descreve sua experiência em
Paris nos anos 1970: “Edifícios gigantescos, ruas, construções da administração
pública desprovidas de alma; mercantilização monopolizada das ruas que
ameaçavam anular a velha Paris… O que era velho não podia durar”. Além disso,
em 1967, Henri Lefèbvre escreveu seu ensaio fundamental, O direito à
cidade [publicado em português pela Saraiva]. Pode nos falar sobre o
período?
O
mundo inteiro considera os anos 1960, como um período de crise urbana. Nos
Estados Unidos, por exemplo, muitas cidades importantes se incendiaram. Houve
revoltas e revoluções em Los Angeles, Detroit e, depois do assassinato de
Martin Luther King em 1968, aproximadamente 120 cidades daquele país viveram
inquietações sociais e ações rebeldes mais ou menos maciças. Ocorre que as
cidades estavam modernizando-se, com base no automóvel e nas zonas
residenciais. A Velha Cidade, aquilo que fora o centro político, econômico e
cultural durantes os anos 40 e 50, estava desaparecendo.
Essa
era a tendência em todo o mundo capitalista avançado, não apenas nos EUA. Havia
sérios problemas na Grã-Bretanha e na França, onde um antigo modo de vida
estava sendo desmantelado – um modo de vida do qual, acredito, ninguém devia
ter saudades. Esse velho modo de vida foi descartado e substituído por um novo,
baseado na comercialização, propriedade, especulação imobiliária, construção de
estradas, automóveis, suburbanização. Com todas essas mudanças, houve um
aumento da desigualdade e das tensões sociais.
A
depender do lugar em que estivéssemos, a desigualdade ou era de classe, ou se
concentrava em minorias específicas. Nos EUA, é claro que a comunidade
afro-americana tinha as menores oportunidades de trabalho e menos recursos. Se
olharmos para trás, veremos que havia programas governamentais na Grã-Bretanha,
França e Estados Unidos para tentar enfrentar a “crise urbana”, sempre do mesmo
modo. É fascinante estudar essa questão, mas traumático vivê-la como
experiência. A crise dos anos 60 foi crucial, e acredito que Lefèbvre tenha compreendido
isso muito bem. Ele acreditava que os moradores deviam ter voz ativa nas
decisões sobre como as áreas deviam ser, o tipo de urbanização que devia ser
adotado. Ao mesmo tempo, os que resistiam queriam inverter a maré da
especulação imobiliária que começava a absorver as áreas urbanas em todos os
países capitalistas industrializados.
Você
escreveu, no primeiro capítulo: “A questão de que tipo de cidade queremos não
pode ser separada da questão de que tipo de pessoas queremos ser, quais
relações sociais procuramos, que relação temos com a natureza, que estilo de
vida desejamos e quais valores estéticos temos”. Mais à frente, você cita a
Comuna de Paris como evento histórico que deve ser analisado, pois talvez nos
ajude a conceituar o que é o “direito à cidade”. Existem outros exemplos
históricos, além deste, sobre os quais podemos refletir? Que desafios temos
pela frente, especialmente no contexto neoliberal?
Penso
que a ideia de que a cidade que queremos construir deva refletir nossos desejos
e exigências pessoais é muito importante. Quem vive num lugar como Nova York
precisa se deslocar pela cidade, precisa se relacionar com os outros de um modo
bem específico. Como todos sabem, os nova-iorquinos tendem a ser frios e
ríspidos. Isso não significa que não se ajudem uns aos outros, mas, para
enfrentar a rotina cotidiana e a enorme quantidade de pessoas nas ruas e no
metrô, você precisa negociar com a cidade de certa maneira. Da mesma forma,
viver em zonas residenciais privadas leva a outros modos de pensar como deveria
ser a vida cotidiana. Estas coisas evoluem para posições políticas diferentes,
que quase sempre implicam a manutenção de certas urbanizações privadas e
exclusivas, à custa do que se passa na periferia. Essas posições sociais e
políticas são fruto do tipo de contexto que criamos.
Para
mim, esse é um conceito muito importante: as respostas revolucionárias ao
ambiente urbano têm muitos precedentes históricos. Por exemplo, em Paris, em
1871, as pessoas queriam um tipo diferente de urbanização; queriam que um tipo
diferente de gente vivesse ali. Era uma reação ao desenvolvimento especulativo
e consumista da classe alta. A revolta que exigia um tipo diferente de relações
sociais, de gênero e de classe.
Poderíamos
citar muitos outros exemplos, como a greve geral de Seattle, em 1919. O povo
assumiu o controle da cidade e criou estruturas comunitárias. Em Buenos Aires,
em 2001, aconteceu a mesma coisa. Em El Alto, na Bolívia, em 2003, houve outro
tipo de revolta. Na França, vimos as áreas suburbanas dissolverem-se em
tumultos e movimentos revolucionários ao longo dos últimos vinte anos. Ora, os
movimentos revolucionários nas áreas urbanas desenvolvem-se lentamente. Não é
possível mudar a cidade inteira em uma noite. Para mim, portanto, o
replanejamento de uma cidade é um projeto de longo prazo.
O
que vemos, porém, é uma transformação do estilo de urbanização no período
neoliberal. A resposta a muitos dos protestos de que falamos foi replanejar as
cidades segundo os princípios neoliberais de autossuficiência, e traduzir a
responsabilidade pessoal, a concorrência e a fragmentação da cidade em
urbanizações privadas e espaços privilegiados. Por sorte, as pessoas são
obrigadas a pensar em algum tipo de transformação revolucionária em
determinados momentos – como em Buenos Aires, em 2001. Eclodiram movimentos que
levaram à ocupação de fábricas e à realização de assembleias. Eles foram
capazes de ditar o modo em que se devia organizar a cidade e começaram a fazer
sérias perguntas: quem queremos ser? Como deve ser nossa relação com a
natureza? Que tipo de urbanização queremos?
Pode
explicar melhor alguns destes termos? Por exemplo, é possível ver a
suburbanização como resultado de “um modo de absorver o excedente de produtos e
resolver o problema da absorção da excedência de capital”? Em outras palavras,
por que nossas cidades foram esvaziadas desse modo específico?
Este
também é um processo longo, infinito. Voltemos aos anos 30 e à Grande
Depressão. Como conseguimos sair dela? Um dos grandes problemas, reconhecidos
por todos, era não haver um mercado forte. A capacidade produtiva estava lá,
mas não havia como absorver o fluxo dos produtos. Havia, portanto, um capital
excedente que não tinha para onde ir. Fizeram-se tentativas frenéticas para
encontrar um modo de gastar o capital em excesso. Houve coisas como o programa
de obras de Roosevelt para a construção de autoestradas, que tentavam absorver
especialmente o excedente de capital e de mão de obra existentes.
Mas
só se encontrou uma solução real com a chegada da II Guerra Mundial. Todo o
excedente foi, então, imediatamente absorvido pelo esforço bélico – na produção
de armas, munições e todo o resto. A guerra pareceu, de início, resolver o
problema da Grande Depressão. Mas a essa altura, surgiu a pergunta sobre o pós-guerra:
o que iria acontecer quando ela acabasse? O que iria acontecer com todo o
capital excedente?
Aqui
começa a suburbanização dos Estados Unidos. A construção de zonas residenciais
– naquele momento tratava-se da construção de zonas ricas – absorveu o excedente
de capital. Inicialmente, construíram o sistema de autoestradas e todos
passaram a precisar de um automóvel, pois a casa de periferia tornou-se uma
espécie de “castelo” para a classe trabalhadora. Tudo isso aconteceu deixando
de lado as comunidades empobrecidas dos centros urbanos. Foi esse o modelo de
urbanização dos anos 1950 e 60.
No
período posterior aos anos 70 acontece o inverso: o centro da cidade torna-se
extremamente rico. De lugar com preços baixos nos anos 70, Manhattan passou a
ser um vasto complexo privado para gente muito rica e poderosa. Nesse meio
tempo, as comunidades empobrecidas – minorias, em geral – foram expulsas para a
periferia. As pessoas fugiram de Nova York para as pequenas cidades do norte do
estado ou para a Pensilvânia.
O
modelo geral de urbanização está relacionado com a questão de onde se encontram
as oportunidades rentáveis para investir o capital. Como sabemos, as
oportunidades rentáveis foram poucas nos últimos 15 anos mais ou menos. Durante
esse tempo, rios de dinheiro entraram no mercado imobiliário para a construção
de casas. Depois vimos o que aconteceu na primavera de 2008, quando a bolha
imobiliária explodiu. Por isso, precisamos considerar a urbanização como
produto da busca de meios para absorver a produtividade e a produção crescentes
de uma sociedade capitalista muito dinâmica, que precisa crescer numa taxa 3%
para sobreviver.
Agora,
você cita o crescimento explosivo do PIB na Turquia e em várias partes da Ásia.
Cita também um paradoxo da China: houve um processo enorme de urbanização nos
últimos vinte anos, mas os mesmos projetos industriais que produzem lucros
enormes deslocaram milhões e destruíram o ambiente natural. Cidades inteiras
estão completamente vazias, já que apenas uma pequena porcentagem da população
pode se permitir luxo e conforto. Pode falar destes fenômenos e contradições?
Bem,
a China está agindo do mesmo modo que os Estados Unidos, quando lançaram a
suburbanização após a segunda guerra. Acho que quando os chineses precisaram
decidir o que fazer – principalmente dentro de uma recessão econômica global e
diante dos lucros muito lentos de 2007-08 –, resolveram enfrentar as
dificuldades econômicas por meio da urbanização e dos programas de
infraestrutura: trens de alta velocidade, autoestradas, arranha-céus, etc. Esse
foi o meio de absorver o excedente de capital. É claro que todos os que
forneceram matérias-primas à China deram-se muito bem: a demanda chinesa foi
muito alta. Ela absorve metade do fornecimento mundial de aço.
A
aparência do mundo muda muito conforme o lugar em que estamos. Acabo de ir a
Istambul (Turquia), e vi guindastes de construção civil por toda a parte. O
país cresce 7% ao ano e é hoje muito dinâmico. Quando se está lá, não é
possível imaginar que o resto do mundo esteja em crise. Depois, com um voo de
duas horas e meia, cheguei a Atenas (Grécia), e nem preciso dizer o que está
acontecendo por lá. É como entrar numa zona de calamidade pública, onde tudo
está parado. As lojas estão fechadas, não há construções em lugar nenhum da
cidade. A distância entre as duas cidades é de menos de mil quilômetros, mas
são dois lugares completamente diferentes. É isso que podemos esperar da
economia global de hoje: alguns lugares em pleno boom e outros que vão à
falência. As crises econômicas têm sempre um desenvolvimento geográfico
desigual. É fascinante contar essa história.
No
capítulo 2, “As raízes urbanas da crise”, você aborda a relação entre crise
econômica nos Estados Unidos, casa própria e direitos de propriedade individual
que são componentes ideológicos importantes do “sonho americano”. Mas logo
avisa que esses “valores culturais” adquirem certa importância quando são
subvencionados por políticas públicas. Que políticas são essas?
Bem,
nos anos 1930, menos de 40% dos americanos tinha casa própria – ou seja, 60% da
população pagava aluguel, principalmente pessoas empobrecidas ou de classe
média. Essas populações estavam inquietas. Por isso, nos anos 40 e 50 ganhou
força a ideia de que era possível estabilizá-las e torná-las favoráveis ao
capitalismo dando-lhes a oportunidade de adquirir casa própria. As instituições
de poupança e crédito receberam muito apoio. Era lá que as pessoas depositavam
suas economias, e estas eram usadas para promover a casa própria das populações
de baixa renda. Aconteceu a mesma coisa na Grã Bretanha com a “Building
Society”.
Essa
tendência teve início, aliás, já por volta de 1890, quando a classe empresarial
pensava em como tornar as populações de renda mais baixa estáveis e menos
irrequietas. Havia uma frase maravilhosa: “os proprietários de casas não fazem
greve”. Lembre-se que as pessoas precisavam contrair dívidas para se tornar
proprietárias. E aí está o mecanismo de controle. Esse sistema, porém, foi
muito fraco nos anos 20, até que nos anos 30 o governo dos Estados Unidos e as
classes empresariais decidiram reforçá-lo. Criaram-se os empréstimos de trinta
anos. Mas para que funcionassem era preciso ter, de algum modo, uma garantia.
Isso levou à criação de instituições públicas que garantissem as hipotecas.
Ao
mesmo tempo, os bancos precisavam encontrar um modo de repassar os empréstimos
a terceiros e foi assim que criaram essa organização chamada Fannie Mae.
Foi isso que aconteceu naquele período: órgãos públicos usados para favorecer e
garantir a propriedade das casas, em particular para as classes média e baixa,
o que as desencorajava na hora de fazer greves ou de sair da linha. Estavam
endividadas. Estas instituições deslancharam realmente depois da II Guerra
Mundial. Houve muita propaganda sobre o “sonho americano” e sobre o que
significava ser americano. Permitia-se deduzir, dos impostos, os juros pagos
sobre o empréstimo. O Estado subvencionava a propriedade da casa; as
instituições públicas promoviam-na.
Já
no governo Clinton, em 1995, promoveu-se a casa própria para as minorias. O
desenrolar da “crise de subprime” esteve estreitamente ligado ao que o setor
privado fazia e também ao que as políticas de governo garantiam. Este é um
aspecto crucial da vida americana: 60% da população pagava aluguel, nos anos
1930; mas, entre 2007/08, atingiu-se um pico em que 70% passou a ter casa
própria. Isso cria naturalmente um tipo diferente de atmosfera política, na
qual a defesa dos direitos e dos valores da propriedade passa a ter grande
importância. Surgem os movimentos de bairro com os quais os proprietários
tentam manter certas pessoas fora de suas áreas, pois dão-se conta de que
poderiam desvalorizar as propriedades. As habitações tornam-se uma forma de
poupança para as famílias de classe média e da classe trabalhadora. As pessoas
têm acesso a essas poupanças por meio do refinanciamento de suas casas. A casa
própria é apresentada, agora, como se fosse o sonho de toda uma vida para os
que vivem nos Estados Unidos. Mas, sem dúvida, esse sonho sempre existiu, pelo
fato de que, ao conseguir um pouco de terra, pode-se cultivar alguma coisa,
conseguir uma vida melhor, etc. Isso fazia parte do sonho dos migrantes. Mas
foi transformado na casa própria suburbana, o que não significa ter vacas e
frangos no quintal, mas sim estar cercado pelos símbolos do consumismo.
Mais
adiante, no mesmo capítulo, você menciona o fato de que devemos ir além de
Marx, mas usando suas percepções mais proféticas. De que modo podemos “ir além
de Marx”?
Marx
é importante porque compreendia profundamente como funciona a acumulação de
capital. Percebia que essa máquina de crescimento perpétuo contém muitas
contradições internas. Uma das contradições fundamentais das quais fala é entre
o “valor de uso” e o “valor de troca”. Vemos com clareza de que modo ela age na
situação da casa. Qual é o valor de uso de uma casa? Bem, é uma forma de refúgio,
um lugar de privacidade, é onde se pode criar uma família. Podemos citar muitos
outros valores de uso.
Mas
ela tem também um valor de troca. Lembre-se que quando alguém aluga uma casa,
aluga-a com base apenas no que lhe é útil. Mas quando alguém compra uma casa,
considera-a como um tipo de poupança e, depois de certo tempo, usa-a como forma
de especulação. Como consequência, os preços das casas aumentam. Nesse
contexto, o valor de troca passa a dominar o valor de uso. A relação entre o
valor de troca e o valor de uso escapa ao controle. Assim, quando o mercado
imobiliário explode, repentinamente cinco milhões de pessoas perdem as casas e
o valor de uso desaparece. Marx fala dessa importante contradição. Precisamos
fazer a seguinte pergunta: o que devemos fazer com a habitação? O que devemos
fazer com a saúde? O que estamos fazendo com a educação? Não deveríamos
promover o valor de uso da instrução? E por que as necessidades vitais devem
ser supridas por meio do sistema do valor de troca? É óbvio que devemos
rejeitar o sistema do valor de troca, refém da especulação e dos lucros
excessivos. É realmente impressionante quanto somos capazes de comprar produtos
e serviços. Essa é uma das contradições que Marx descreveu muito bem.
No
capítulo “A criação dos bens comuns urbanos”, de Cidades Rebeldes,você
tenta elaborar um novo conceito sobre o que o “comum” pode representar neste
século. Além disso, faz referências ao trabalho de Toni Negri e Michael Hardt
em todo o livro. Como vocês todos afirmam, precisamos definir o modo em que
transferiremos, promoveremos e usaremos o “comum”. Mas como conceituá-lo?
Bem,
muitos dos textos sobre os bens comuns abordam a questão em escala
microscópica. Não digo que seja um erro ter, por exemplo, uma horta comunitária
no bairro, mas acho que precisamos nos preocupar e falar sobre os bens comuns
em grande escala, como o habitat de uma bio-região. Como gerir os recursos
hídricos em nível nacional? Sem falar do nível global. Os recursos hídricos
deveriam ser considerados de propriedade comum, mas há, às vezes, exigências
conflitantes em relação à água: urbanização, agricultura industrial e toda a
manutenção dos habitats naturais.
Recentemente,
Christian Parenti escreveu um artigo chamado “Por que as mudanças climáticas o
farão adorar o intervencionismo do governo”, que trata de modo muito sério a
organização social e as consequências políticas e econômicas das mudanças
climáticas. Parenti aborda concretamente a questão de como usar o aparelho do
Estado. O que pensa sobre isso?
Fico
contente que você cite o texto de Christian Parenti, porque as mudanças
climáticas deveriam nos levar a um novo conceito de bens comuns globais. A
pergunta é: como vamos tratar essas questões no futuro? Precisamos de
mecanismos de ação entre estados-nações para combater essas tendências ou
evitar futuras ameaças. O que vai acontecer com os tratados internacionais se
os governos forem destruídos? Quem vai conseguir que outros países parem de
emitir carbono na atmosfera? Não se pode fazer isso organizando “assembleias
coletivas” ou “refeitórios comunitários”. As discussões sobre converter um
pedaço de terra em horta comunitária não conseguirão combater os problemas que
nossa espécie deverá enfrentar. Devemos considerar que existem bens comuns em
diferentes escalas.
Por
isso, gostaria de lançar o conceito de “diferentes escalas de organização” na
nossa conversa coletiva sobre desenvolvimento, sustentabilidade e urbanização.
Precisamos desenvolver organizações, mecanismos, discursos e aparelhos capazes
de abordar esses problemas em escala global. Não adianta nada discutir sobre os
“bens comuns”, se não especificarmos a que escala nos referimos. É do mundo que
falamos? Se for, sugiro que se fale dos aparelhos do Estado e de suas funções.
No
capítulo 4, “A arte da renda”, você diz que “as escolas de arte foram fonte de
debate político, mas a pacificação que sofreram em seguida diminuiu seriamente
a política de agitação”. Pode falar sobre a natureza especial da produção
e da reprodução cultural? De que modo o “empreendedorismo urbano” ajudou esse
processo? Você o chama de “disneyficação” da sociedade e da cultura. O que é o
capitalismo coletivo e simbólico? Você cita a indústria do turismo e também o
marketing de cidades específicas, sentimentos culturais e a “comercialização
das cidades”. Pode nos falar sobre essas dinâmicas?
Meu
interesse nisso tudo vem de uma contradição muito simples: presume-se que
vivemos sob o capitalismo; que o capitalismo é competitivo; e, assim,
imaginamos que capitalistas e empresários gostem da concorrência. Bom, acontece
que os capitalistas fazem todo o possível para evitá-la. Amam os monopólios.
Por isso, sempre que podem, procuram criar um produto que seja monopolizável, o
que significa, em outras palavras, “único”. Tomemos, por exemplo, o logotipo da
Nike, que é um exemplo perfeito de como os capitalistas extraem um preço de
monopólio de um logo particular, visto que há uma enorme bagagem associada a
ele, ao que ele significa, e a como as pessoas devem interagir com ele. Um
tênis igualzinho custa muito menos e pode ser vendido a preço inferior
simplesmente porque não tem o logo. Em muitos lugares, esse componente é
fundamental no funcionamento dos mercados. Cito, nesse capítulo, o comércio do
vinho porque me intriga muito. As pessoas tentam extrair uma renda de monopólio
porque tal vinhedo tem um solo especial ou uma posição geográfica especial.
Criam, assim, um vinho “vintage” único, que tem um sabor melhor do que qualquer
outra coisa no mundo, só que não é verdade.
No
plano das cidades, isso significa que elas tentam “comercializar” a si mesmas.
Existe toda uma história, em particular dos últimos 30 ou 40 anos, de como
tentam vender um pedaço de sua história. Qual é a imagem de uma cidade? É
atraente para os turistas? Está na moda?
Há
cidades que não têm uma reputação semelhante à de Barcelona ou Nova York. Um
dos modos de melhorar sua singularidade é vender algo que esteja ligado a sua
história, algo muito específico que não tenha paralelos históricos em outro
lugar. Por exemplo, vamos a Atenas pela Acrópole, ou a Roma pelas ruínas
antigas. E se não houver uma história especial, simplesmente inventa-se uma.
Algumas
cidades usam a “arquitetura de grife”. Pouca gente conhecia Bilbao antes que o
Museu Guggenheim se tornasse o centro de um estilo particular de arquitetura.
Pense em Sydney (Austrália) com a sua Opera House, que é a primeira coisa que
as pessoas reconhecem quando veem a imagem da cidade, e entenderá a importância
que esse teatro teve. A própria arquitetura torna-se refém da comercialização.
Até mesmo as pinturas e as ambientações musicais são convertidas em aspectos
culturais da cidade para que possam ser vendidas. Lugares como Austin (Texas)
tornam-se “cenas musicais”.
O
problema é que grande parte da cultura é muito fácil de copiar. A singularidade
começa a desaparecer. É necessário, então, aquilo que chamo de “disneyficação”
da sociedade. Na Europa, por exemplo, veja como tudo se “disneyfica”, embora
muitas cidades tenham um passado cultural e histórico sério. Para algumas pessoas
– para mim, por exemplo – isso é extremamente repugnante. Vende-se uma cidade
como única, mas, por meio do marketing, ela pode ser copiada. Os simulacros da
história tornam-se tão importantes quanto a própria história. Isso cria uma
situação em que os produtores culturais adquirem muita importância.
No
capítulo 5, “Reivindicar a cidade por meio da luta anticapitalista”, você
escreve: “Dois problemas surgem dos movimentos políticos baseados nas cidades:
1) a cidade, ou o sistema de cidade, é um lugar meramente passivo ou uma rede
pré-existente? 2) Os protestos públicos costumam medir seu sucesso com
base em quanto são capazes de perturbar as economias urbanas”. Pode dar alguns
exemplos desse tipo de perturbação? De que modo os dissidentes poderiam perturbar
as economias urbanas de modo mais eficaz?
Há
muitos exemplos históricos. Nos anos 1960, por exemplo, em muitas cidades dos
Estados Unidos, as agitações provocaram grandes incômodos aos negócios.
Políticos e empresários reagiram rapidamente em razão do nível das perturbações
e da destruição. Cito, no livro, as manifestações de trabalhadores migrantes na
primavera de 2006. Os protestos foram uma resposta à tentativa, feita pelo
Congresso, de criminalizar os imigrantes clandestinos. As pessoas mobilizaram-se
em cidades como Los Angeles e Chicago, e perturbaram significativamente os
negócios da cidade. É possível também adotar a ideia da greve – geralmente
dirigida contra uma determinada empresa ou organização – e transferir suas
táticas e estratégias para os centros das cidades. Em vez de fazer greve contra
uma empresa ou uma atividade ou comércio específicos, as pessoas podem dirigir
essas ações para inteiras áreas urbanas.
E
existem também eventos como a Comuna de Paris e a greve geral em Seattle de
1919, ou ainda a revolta do Cordobazo em Córdoba, Argentina, 1969. Não é
preciso criar um movimento revolucionário do dia para a noite. As coisas podem
acontecer gradualmente, por meio de reformas. Há um exemplo interessante de
Orçamento Participativo, que começou em em Porto Alegre (Brasil), mas continuou
em algumas cidades europeias. As populações debatem como o dinheiro deve ser
gasto. Fazem assembleias populares que decidem como usar os fundos e os
serviços públicos. É uma grande ideia. Envolve o público e faz com que as
pessoas participem. As decisões não são mais tomadas pelas prefeituras, pelos
burocratas a portas fechadas. Estão abertas ao debate público. Assim, de um
lado, há intervenções rápidas sob a forma de greves e interrupções. Do outro,
um processo de reforma que ocorre por meio de assembleias democráticas, etc.
No
capítulo 5, você escreve: “Na tradição marxista, as lutas urbanas são muitas
vezes ignoradas ou pouco valorizadas, porque não têm potencial ou importância
revolucionária. Quando uma luta urbana adquire um status revolucionário
emblemático, como durante a Comuna de Paris em 1871, ela é descrita, primeiro
por Marx, e com ainda mais veemência por Lenin, como revolta proletária, e não
como movimento revolucionário muito mais complicado, estimulado tanto pelo
desejo de recuperar a cidade da apropriação burguesa quanto pela desejada
liberação dos operários da dura opressão de classe nos locais de trabalho. Dou
importância simbólica ao fato de que as duas primeiras decisões da Comuna de
Paris tenham sido abolir o trabalho noturno nas padarias – uma questão
trabalhista – e impor uma moratória aos aluguéis – uma questão urbana”. Pode
falar da prioridade dos trabalhadores industriais na ideologia marxista? Como
podemos começar a conceituar de modo novo o proletariado?
É
uma longa história. A tendência, nos ambientes marxistas – e não só neles, mas
na esquerda em geral –, é dar prioridade ao trabalhador industrial. A ideia de
uma luta de vanguarda que leve a uma nova sociedade vigorou por algum tempo.
Muito disso deriva, é claro, do volume I de “O Capital” de Marx, que dá ênfase
ao operário de fábrica. A ideia de que o partido de vanguarda dos trabalhadores
nos levará à nova Terra Prometida da sociedade anticapitalista, digamos
“comunista”, dura há mais de um século. Sempre achei que fosse uma concepção
muito restrita do que é o proletariado e do que é a “vanguarda”. Além disso,
sempre estive interessado na dinâmica da luta de classes e na sua relação com
os movimentos sociais urbanos.
Para
mim, os movimentos sociais urbanos são muito mais complicados. Ocupam um vasto
leque, que parte das organizações de bairro burguesas, dedicadas a uma política
de exclusão, e vai até a luta de inquilinos contra proprietários, em razão das
práticas de exploração. Quando examinamos o amplo espectro dos movimentos
sociais urbanos, descobrimos que alguns são anticapitalistas e outros, o
contrário.
Mas
é preciso fazer a mesma observação quanto a algumas formas de sindicalismo
tradicional. Alguns sindicatos consideram a organização como um modo de
favorecer os trabalhadores já privilegiados na sociedade. Essa ideia certamente
não me agrada. Há outros que buscam criar um mundo mais justo e equitativo.
Examinemos
as formas de organização de Antonio Gramsci. Ele estava muito interessado nos
conselhos de fábrica. Seguia a linha marxista segundo a qual a organização de
fábrica é crucial na luta. Mas, além disso, exortava as pessoas a
organizarem-se nos bairros. Segundo seu pensamento, elas podiam alcançar uma
situação melhor para toda a classe operária e não apenas para a que se
organizava nas fábricas. Isso incluía os desempregados, os trabalhadores
precários e todos os que você citou que não trabalhavam nos setores industriais
tradicionais. Gramsci propunha que esses dois tipos de organização se entrelaçassem
para representar realmente o proletariado. Em síntese, meu pensamento reflete o
dele.
A
meu ver, deveríamos abandonar a ideia de que o operário de fábrica será a
vanguarda do proletariado e começar a considerar os trabalhadores empenhados na
produção e reprodução da vida urbana como a nova vanguarda. Isso inclui
trabalhadores domésticos, taxistas, vendedores, muitas outras classes e pobres.
Acho que podemos construir movimentos políticos que operem de modo totalmente
diferente em relação ao passado. Vejo isso em cidades do mundo todo, desde as
cidades bolivianas até Buenos Aires. Combinando o trabalho dos ativistas
urbanos ao daqueles que trabalham nas fábricas, começamos a desenvolver um
estilo completamente diferente de agitação pública.
Pode
falar sobre uma dessas cidades, como El Alto (Bolívia)?
Li
tudo o que pude sobre El Alto (Bolívia), e o que mais me fascina são as formas
de organização que se criaram. Havia um forte sindicato de professores à frente
do movimento. Mas havia também muitos ex-sindicalistas que estavam nas minas de
estanho e ficaram desempregados na década de 1980, anos do ajuste neoliberal.
Essas pessoas acabaram indo viver na cidade de El Alto, onde há uma tradição
política de ativismo socialista. Militavam num movimento sindical onde havia
principalmente trotskistas, o que é significativo.
Entretanto,
as organizações mais importantes eram as de bairro. Além disso, havia uma
assembleia geral das organizações de bairro chamada Federación de
Organizaciones Barriales. Havia, por exemplo, organizações de vendedores
ambulantes, além de trabalhadores do transporte. Esses diferentes grupos
reuniam-se com bastante regularidade. O interessante da dinâmica deles é que
não tinham a mesma opinião sobre todos as questões. Que sentido teria ir a uma
reunião em que todos estão de acordo? Participavam das reuniões para garantir
que seus interesses não fossem prejudicados. É o que acontece quando há debates
acesos e discurso político: progresso. Assim, o ativismo das federações de
bairro nasceu a partir de métodos de organização muito competitivos. Em
seguida, quando a polícia e o exército começaram a assassinar as pessoas na
rua, houve uma manifestação imediata de solidariedade entre os grupos que
tinham se formado na cidade. Fecharam a cidade e interditaram as ruas. Os
habitantes de La Paz não podiam receber bens e serviços porque três das ruas
principais da cidade passavam diretamente por El Alto, que tinha sido fechada
pelas organizações.
Isso
foi feito em 2003 e o resultado foi a derrubada do presidente. Em 2005
derrubaram o presidente seguinte. E enfim chegou Evo Morales. Todos esses
elementos se uniram e se organizaram de modo eficaz para os pobres e para a
classe operária na Bolívia. Foi dali que tirei o título de meu livro, Cidades
Rebeldes. Literalmente, El Alto tornou-se uma cidade revolucionária em
poucos anos. É fascinante estudar e observar as formas de organização na
Bolívia. Não digo que este seja “o modelo” que todos devem copiar, mas é um bom
exemplo a ser observado e estudado.
Você
fala de um filme muito especial, O sal da terra. O que
ele pode nos ensinar sobre a luta?
Bem,
assisti ao filme [“Salt of the Earth”, dirigido por Herbet J. Biberman, 1954,
pode ser assistido integralmente aqui – Nota
da Tradutora] pela primeira vez há muito tempo. Mas sempre gostei de
pensar nele. Quando me sentei para escrever este livro, eu o vi novamente e,
depois, mais algumas vezes. É uma história muito humana. É a maravilhosa
história de uma mina de zinco, baseada em fatos reais, escrita por pessoas que
haviam sido banidas de Hollywood por suas tendências comunistas. É um grande
filme em que classe, raça e gênero unem-se para formar uma grande história.
Há
um momento singelo no filme: os rapazes não podem mais fazer piquetes em razão
da lei Taft-Hartley, e então as mulheres os substituem, já que nada as impede.
E os homens precisam, então, cuidar dos afazeres domésticos. É interessante
notar que eles passam imediatamente a entender por que as mulheres lhes pediam
que exigissem dos patrões água corrente e outras coisas que tornassem o
cotidiano mais fácil. Com rapidez, e de modo natural, os homens descobrem como
é difícil ficar em casa o dia inteiro. Isso reúne questões de gênero que são,
ainda hoje, importantes. E aborda a solidariedade para além das fronteiras
étnicas, hoje cruciais. O filme presta um grande serviço ao ressaltar tudo isso
de modo não didático. Sempre gostei, então achei oportuno recordá-lo nas
páginas de Cidades Rebeldes.
Alguma
palavra de despedida para quem lê ou escuta essa entrevista?
Infelizmente
não sou organizador, sou analista dos limites do capital e de como conceituar
pontos de vista alternativos para a sociedade. Ganhei muita força, motivação e
ideias daqueles que estão concretamente envolvidos todos os dias nas lutas.
Participo e, se puder, ajudo. O conselho que dou a todos é ir para as ruas o
mais possível, enfrentar a desigualdade social e a degradação ambiental, pois
esses problemas estão cada vez mais presentes. Gostaria que as pessoas se
tornassem ativas, avançassem. Esse momento é crucial. O grande capital não
cedeu em nada até agora. Precisamos produzir um impulso enorme se quisermos ver
algo diferente em nossa sociedade. Precisamos criar mecanismos e formas de organização
que reflitam as necessidades e os desejos da sociedade como um todo, e não
apenas de uma classe privilegiada e oligárquica.
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