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São Luís, Maranhão, Brazil
Homem simples e comum: procuro ser gentil com as pessoas, amigo dos meus amigos e bondoso com a minha família. Sou apaixonado por filmes, internet, livros, futebol e música. Estou tentando sempre equilibrar corpo e mente, manter-me informado das notícias a nível mundial, ministrar aulas de geografia em paralelo às pesquisas acadêmicas que desenvolvo e, no meio de tudo isso, tento achar tempo para o lazer e o namoro. Profissionalmente,sou geógrafo e professor de Geografia no Ensino Básico, Técnico e Tecnológico do Instituto Federal do Maranhão (IFMA ­ Campus Avançado Porto Franco) e Doutorando em Geografia Humana na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. Membro do Grupo de Estudos: Desenvolvimento, Modernidade e Meio Ambiente (GEDMMA) e do Núcleo de Estudos do Pensamento Socialista Pesquisa do Sindicalismo (NEPS), ambos da UFMA. Participo da Rede Justiça nos Trilhos.

quarta-feira, 23 de julho de 2014

No exterior, Vale enfrenta protestos por riscos ambientais

terça-feira 22 de julho de 2014
RIO - Não bastasse os preços baixos do minério de ferro, a Vale tem se deparado com o ressurgimento da oposição a alguns projetos no exterior, em meio a processos eleitorais locais. Na Nova Caledônia, território francês onde a mineradora tem uma mina de níquel, uma onda de protestos estourou em abril, após mais um vazamento de efluentes ácidos na unidade, no Sul do arquipélago.
O acidente, que matou cerca de mil peixes, deu munição à agitação política. No mês seguinte, foram eleitos novos membros do Congresso, que decidirão sobre o referendo que trata da possível independência em relação à França.
Veículos e edifícios da Vale foram incendiados, interrompendo a produção por três semanas. A empresa atua na Nova Caledônia em parceria com companhias japonesas e um pool de províncias do arquipélago.
No Peru, onde haverá eleições municipais em outubro, a Vale é acusada de não tomar os devidos cuidados no embarque de fosfato (matéria-prima para fertilizantes), em seu terminal na Baía de Sechura, Nordeste do país, o que colocaria em risco o meio ambiente e a atividade pesqueira.
A Vale opera no país por meio da subsidiária Miski Mayo, que tem a americana Mosaic e a japonesa Mitsui como sócias.
IMPACTO EM ÁREA PROTEGIDA
A Vale herdou as operações na Nova Caledônia ao comprar a canadense Inco em 2006, tornando-se a segunda maior produtora de níquel no mundo. As reservas no território francês são 25% das de níquel da Vale e têm vida útil até 2043.
Mas a sustentabilidade do projeto é questionada por ONGs, que temem o impacto sobre um conjunto de lagoas consideradas patrimônio da Humanidade pela Unesco. Desde 2009, elas contabilizam ao menos cinco vazamentos, alguns envolvendo ácido sulfúrico. Segundo o ativista Sarimin Boengkih, o local de despejo de efluentes está situado a 3,5 quilômetros das lagoas.
— Com a sucessão de acidentes, as pessoas estão cada vez menos confiantes no processo de produção de níquel da Vale — afirma Boengkih.
A mineradora reconhece que houve problemas na implantação do projeto, mas assegura que “a operação é viável e segura”. E informa que uma auditoria externa confirmou que o controle de efluentes é adequado. A Vale já foi multada em US$ 460 mil.
PERU: DENÚNCIAS DESDE 2011
No Peru, a exploração de fosfato tem importância estratégica para a Vale, pois o Brasil é deficitário em fertilizantes. Segundo a comunidade local, porém, no momento do embarque em navios, há dispersão de material particulado no ar e na água, o que pode causar problemas respiratórios e desequilíbrios no ecossistema marinho. A primeira denúncia foi feita em 2011 pelo Sindicato de Trabalhadores da Petroperu, petroleira que tem um terminal a cerca de 300 metros do da Vale.
— Agora, os embarques têm sido à noite, para que ninguém note — diz Evin Querevalú, presidente do sindicato.
A Vale explica que o carregamento de navios pode gerar pó e assegura que está trabalhando para melhorar o sistema. E ressalta que uma multa ambiental local foi anulada em abril.
Para analistas de mercado, a oposição aos projetos não deve afetar o desempenho financeiro da Vale.

VI Encontro Regional dos Atingidos pela Mineração

terça-feira 22 de julho de 2014
Já não podemos calar.
Chega o tempo de vencer,
Chega o dia de lutar sem morrer.
A única forma de vencer a morte é enfrentá-la
O único jeito de vencer é lutar
O único modo de fazer justiça é continuar lutando.
Assim viveremos eternamente.
(Ademar Bogo)
Foi entre mobilizações, estudos, debates, intercâmbios, poesias e músicas que aconteceu o VI Encontro Regional dos Atingidos pela mineração e o IV Encontro da Juventude Atingida pela Mineração (EJAM). Os dois encontros foram realizados nos dias 18 e 19 de julho, em Marabá – PA. Cerca de 150 jovens e adultos do Maranhão e Pará refletiram, debateram e elencaram planos sobre os impactos da mineração.
Os dois estados estão inseridos em um dos territórios mais impactados pelas atividades de extração, transporte e escoamento do minério de ferro. Para Danilo Chammas, advogado da Rede Justiça nos Trilhos, existe hoje no Brasil uma política que o coloca como exportador de riquezas. “Mais de 50% do minério de ferro que a Alemanha importa sai do Brasil; desse, boa parte é extraído do Pará. A Alemanha é líder na produção de peças para automóveis, com isso, as peças que são produzidas com matéria-prima do Brasil, retornam mais encarecidas para nós”.
Há ambiguidades na gestão político-econômica do plano nacional de mineração. Entre eles, a flexibilização da legislação, a privatização de serviços e o financiamento de empreendimentos e grandes projetos com dinheiro público. Os movimentos sociais e as comunidades encontram-se num contexto adverso e denunciam a crescente violência ambiental nos territórios onde há exploração mineral. Durante o Encontro dos Atingidos pela mineração, os moradores de comunidades rurais e urbanas do Pará e Maranhão se identificaram como vítimas de dezenas de impactos.
Destruição do ambiente, violação dos direitos de ir e vir e do direito à informação, poluição, violência, ausência de políticas públicas. Qual a relação desses problemas com a mineração? Para Raimundo Gomes da Cruz, do CEPASP, desde 1984 começou a preocupação com as questões ambientais ligadas à implantação de grandes projetos. “A barragem de Tucuruí, por exemplo, gerou impactos que até hoje não foram reparados. Comunidades inteiras deram lugar ao interesse pela geração de energia. Muitas dessas pessoas ainda hoje vivem sem energia elétrica. Essa é a farsa das grandes empresas, para implantar a desgraça em nossas terras”. Ele conta que também acompanhou a construção da Estrada de Ferro Carajás (EFC), um projeto que desestrutura as comunidades por onde passa.
Segundo Danilo Chammas, a maioria desses empreendimentos, assim como a duplicação da EFC, o mais novo projeto da empresa Vale S.A. em andamento, são realizados de forma ilegal. “Entretanto, o lado bom é que a legislação dos direitos humanos garante que os direitos sejam reparados de forma integral. Então precisamos nos antecipar, quanto à chegada de novos empreendimentos em nossa região”.
Na semana que antecedeu o Dia Mundial contra a Mineração, comemorado no dia 22 de julho, os participantes do Encontro Regional dos Atingidos pela Mineração dialogaram e refletiram sobre um futuro sem mineração ou um futuro onde os recursos naturais sejam usados de forma sustentável.
Juventude e Mineração
A chegada de grandes projetos em uma região muda o cotidiano das pessoas. Problemas como inchaço populacional, aumento da violência, prostituição, dentre outros são exemplos de impactos que esclarecem a relação entre mineração e juventude.
Para Marcelo Melo, militante do Movimento Debate e Ação (Marabá-PA), essas problemáticas têm como causa a vinda dos grandes projetos de desenvolvimento. “Marabá está entre as cidades mais violentas do país. Nós, da juventude, somos tão atingidos quanto os nossos pais”. O encontro possibilitou o diálogo entre os jovens e as pessoas que são atingidas pela mineração há mais tempo.
Durante o Encontro dos Atingidos pela Mineração, a Articulação da Juventude foi responsável pela poesia, músicas e gritos de ordem. Mas também demonstraram conhecimento de suas realidades e vontade de mudá-las. “É muito bom ver essa juventude, percebo que tem uma nova geração de luta em construção”, afirmou uma liderança sul-africana que visitou o encontro, numa atividade de intercâmbio internacional entre atingidos.
A relação entre a empresa Vale S.A e as comunidades
Moradores da África do Sul, Moçambique e diferentes municípios do Pará e Maranhão denunciaram os impactos gerados pela mineração, sob a responsabilidade da empresa Vale S.A.
Eles também explicaram como é a relação entre a empresa e as pessoas: ameaças, espionagem, promessas, desarticulação da comunidade, falta de diálogo, etc. De acordo com os moradores, a empresa não cumpre com a responsabilidade social e o lucro gerado pela mineração não tem retorno para as comunidades impactadas.
A comunidade Vila Concórdia, localizada no município de Buriticupu-MA é um exemplo de como a empresa se comporta. É uma das localidades onde iniciaram as obras de duplicação da EFC, mas a população não sabe o que vai acontecer.
Para Danilo Chammas “a Vale e o Estado brasileiro têm um plano e eles já sabem o que vai acontecer. As comunidades precisam se articular e saber que a Vale e o Estado têm dívidas para com as comunidades. Mas é evidente que os interesses da empresa não são os interesses da comunidade. É uma relação de direitos que a comunidade têm e obrigações que a empresa precisa cumprir”. 
“Se formos ver o que a Vale faz com os camponeses africanos, é o mesmo que faz com os camponeses brasileiros. Então, a luta é só uma”, afirmou uma moradora da África do Sul. A articulação entre diferentes comunidades tem garantido acesso a informação e busca por direitos.
“Cansados? Não! Na luta, ninguém se cansa”... As palavras de ordem de um sul africano deram motivação a integrantes de movimentos sociais, entidades e comunidades atingidas por grandes projetos de mineração que terminaram o VI Encontro Regional dos Atingidos pela Mineração cheios de planos e esperança.
Rede Justiça nos Trilhos

Você já respirou pó de ferro? Conheça o ar sujo de Piquiá

terça-feira 22 de julho de 2014
Quem não está acostumado sente logo a contaminação do ar. São terríveis os efeitos de se inalar o chamado pó de ferro, um incômodo composto preto de pelotas de minério de ferro com poeira de carvão que provoca dores de cabeça, coceiras na pele, no couro cabeludo e dificuldades de respirar. A rinite alérgica é um dos primeiros sintomas sentidos por quem chega ao povoado de Piquiá de Baixo, em Açailândia, município no interior do Maranhão, dentro da área da Amazônia Legal.
“É isso o que acontece com quem não está acostumado com o pó de ferro”, diz Wellem Pereira de Melo, um dos representantes da associação de moradores desta comunidade de cerca de 300 famílias e 1.100 habitantes. Aos 56 anos, Wellem teve que se mudar de Piquiá de Baixo para Piquiá de Cima, bairro vizinho distante 2 km, a mando do médico que o proibiu de respirar o ar do povoado.
A autora desta reportagem foi acolhida na casa de uma família em Piquiá de Baixo na beira da BR-222 e pôde sentir os danos da poeira metálica. Mesmo em dias chuvosos, dá para sentir a fuligem aparentemente invisível. E seus estragos.
Doenças
A exposição prolongada à poeira e vapores de ferro provenientes do processamento do mineral podem causar problemas à saúde e diminuir a resistência do organismo às infecções respiratórias. A poeira em Piquiá contém também carbono, manganês, cromo, cobre, níquel, fósforo e silício. A curto prazo, os efeitos são irritar o pulmão e a mucosa da garganta.
A longo prazo, os efeitos crônicos da inalação da poeira de ferro fundido podem gerar manchas no tórax dificultando a respiração. Segundo artigo do Jornal de Pneumologia, o pó de ferro quando inalado por longo tempo causa uma lesão mista nos pulmões denominada “siderossilicose”, e há evidências do aumento da incidência de câncer no pulmão e doenças obstrutivas das vias aéreas causadas diretamente por essa exposição.
A chamada “siderose pulmonar” é gerada pela inalação de poeiras contendo óxidos de ferro. Apesar de não ser uma patologia rara, o jornal científico informa que a siderose não é descrita com frequência na literatura brasileira. Ela pode ser evitada, mas em geral não é tratada.
Não são raros os casos que envolvem complicações pulmonares de moradores em Piquiá de Baixo, onde eles respiram este pó metálico espalhado pelo vento após emitido pelas chaminés dos 14 altos-fornos de cinco siderúrgicas ao redor.
Morte por infecção pulmonar
A morte mais recente na comunidade foi de uma mulher de 32 anos, vítima de embolia pulmonar. Deucivânia Oliveira Lima era casada e tinha três filhos, sendo um deles um bebê de seis meses. Ela faleceu em 18 de março deste ano e a causa da morte, como indica a certidão de óbito, foi sepse grave e tromboembolismo pulmonar, resultado de uma infecção bacteriana que atacou o pulmão.
“Deucivânia, estudou comigo desde criança, conheço os seus pais e seus filhos. Já na gravidez, ela sentia dificuldade respiratória e as crises foram se agravando. Depois que o bebê nasceu, ela piorou”, conta Joselma Alves de Oliveira, 37, professora nascida e criada em Piquiá. Ela acompanhou todo o período em que sua amiga esteve internada.
“O pó de ferro é preto, essas partículas entram nas nossas vias respiratórias e vão para o pulmão. Provavelmente, todo mundo tem problema pulmonar em Piquiá. Quem não tem hoje vai ter no futuro”, diz Joselma que há 10 anos sofre com intensa irritação na garganta e inflamação nos ouvidos. “É só varrer a casa para tirar o pó de ferro que fico com irritação. Tenho constante inflamação na garganta e nos ouvidos, eles ficaram mais sensíveis pelas alergias”, relatou.
Poluição vista a olho nu
As pessoas respiram pó de ferro todos os dias e estão adoecendo por problemas pulmonares, doenças de pele e de visão. “A poluição é vista a olho nu”, afirma Danilo Chammas, advogado da associação de moradores da comunidade e membro da Rede Justiça nos Trilhos, que acompanha povoados impactados ao longo de 900 km da ferrovia Carajás. Piquiá de Baixo é o caso mais grave. “Lá são as maiores incidências de doenças que estão relacionadas diretamente à poluição”, alerta Chammas.
É triste morar num local onde praticamente toda a população tem chance de ter doenças de pulmão, garganta e problemas respiratórios, lamenta Joselma ao dizer-se preocupada com a saúde de sua filha de 14 anos. “Temos muitas crianças em Piquiá e todo mundo da minha geração tem problemas respiratórios e de pele”, diz.
A Rede Justiça nos Trilhos contabiliza quatro mortes nos últimos 15 meses relacionadas a problemas pulmonares.
"É poluição demais"
Ao caminhar pelas ruas de terra batida de Piquiá de Baixo, à beira da BR-222, é fácil ver crianças brincando de carrinho e mulheres sentadas em bancos de madeira observando o movimento de caminhões da rodovia. O clima é de tranquilidade. Em um final de tarde após um dia ensolarado e quente, em que a temperatura chegou a 35°C, encontro a moradora Lucilene da Silva Assunção, de 43 anos, perto dos portões de uma das indústrias de gusa.
Ela vive numa casinha de paredes azuis com o marido e um netinho de pouco mais de um ano. Sua casa tem como vista a rodovia federal e a entrada da Companhia Siderúrgica Vale do Pindaré, do Grupo Queiroz Galvão. Ela mora há 20 anos na comunidade e diz que a vida tem se tornado cada vez mais difícil para as crianças de Piquiá.
“A poluição é demais, as crianças ficam doentes. A gente está para não aguentar. É só botar uma bacia de água no quintal que no dia seguinte ela fica preta. De noite eu fico espirrando. Vou direto ao posto de saúde levar as crianças”, diz Lucilene, mãe de quatro filhos e já avó. Na semana em que a reportagem visitou Piquiá o netinho estava com febre e gripado. Durante a conversa, a neta Lauane, de 6 anos, tossia sem parar.
Para Antônio José Ferreira Lima e Filho, integrante do Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos de Açailândia, ONG criada em 1996, o que ocorre em Piquiá de Baixo é a demonstração de “violência, descaso do ferro gusa com o ser humano e também descaso político com as pessoas”.
“Não existe no Maranhão outro lugar onde a violação de direitos humanos aconteça com maior força do que aqui. É uma convivência impossível há mais de 20 anos. A comunidade tem que sair, apesar de ter chegado primeiro que as guseiras. E vão ter que sair pelo tipo de violência causada pelas indústrias”, comenta Antônio Filho.
Esta é a segunda reportagem da série especial Piquiá de Baixo, sobre a vida dos impactados ambientais da produção de ferro gusa no Maranhão.
Por Fabíola Ortiz
Foto: Fabíola Ortiz/O Eco

sexta-feira, 18 de julho de 2014

Piquiá de Baixo: Caixa Econômica Federal avalia o novo terreno da comunidade


Por , 17/07/2014 18:02
Piquia de BaixoMikaell Carvalho, Rede Justiça nos Trilhos
Na manhã do sábado (12), foi realizada uma análise técnica no terreno para qual o bairro de Piquiá de Baixo será realocado, a área está localizada as margens da BR 222, próxima ao posto da Polícia Rodoviária Federal de Açailândia/Ma. A empresa credenciada pela Caixa Economia Federal para executar esse trabalho foi a A.Z. Construções Ltda, de São Luís/MA.
Com o objetivo de comprovar os dados referentes ao projeto urbanístico habitacional entregue pelos moradores de Piquiá de Baixo à Caixa Econômica, a análise foi dividida em duas partes. A primeira com uma visita técnica ao terreno, para comprovar se ele de fato existe, se as medidas são as mesmas apresentadas no projeto, averiguar se local é propício para habitação, entre outros fatores.
Na segunda parte, alguns moradores do bairro tiveram que responder um questionário referente a área do terreno. Algumas das perguntas que constavam são, há rede elétrica nas proximidades? Existe rede de água? Como será o sistema de esgoto? Há rio próximo? Segundo a empresa, o questionário serve para recolher mais informações e também confirmar as existentes no projeto.
A Caixa Econômica exige que seja feita a análise para dar continuidade ao processo de reassentamento. “Nosso trabalho aqui é técnico, a Caixa manda a gente constatar se tudo corresponde ao que está no projeto urbanístico e habitacional”, relata o engenheiro civil, da A.Z. Construções Ltda, Araam Rabelo, responsável pela análise.
Os moradores acompanharam a vistoria e forneceram todas as informações solicitadas pelo engenheiro. A empresa afirmou que o relatório da análise será entregue em 20 dias à Caixa Econômica, para ser anexado ao processo de reassentamento. Caso os dados apresentados sejam divergentes, será pedido a Associação de Moradores do Piquiá de Baixo que atualize as informações para que o processo continue dentro da lei.
Para o presidente da associação de moradores, Edvar Dantas, é mais um passo que a comunidade dar rumo ao reassentamento. “Tenho certeza, que tudo vai ocorrer bem, o nosso projeto está todo dentro dos conformes e a análise feita aqui no terreno vai comprovar isso”

quarta-feira, 16 de julho de 2014

Piquiá, um povoado coberto por pó de ferro na Amazônia

 
Fabíola Ortiz - 14/07/14

DSCN4140Vista do povoado de Piquiá de Baixo, no distrito industrial de Açailândia (MA). Casas de moradores dividem espaço com fábricas de ferro gusa ao funda. Foto: Fabíola Ortiz
Enviada especial a Açailândia, Maranhão – Piquiá de Baixo é um pequeno povoado onde vivem cerca de 300 famílias na zona rural de Açailândia, no sudoeste do Maranhão. Piquiá está morrendo. Os 1.100 moradores do vilarejo, localizado a 15 quilômetros do centro do município, respiram pó de ferro emitido pelas cinco siderúrgicas que recebem e processam o minério extraído em Carajás, no Pará. Muitos adoeceram e deixaram a cidade.
A história do povoado e seus moradores é o tema da série especial que começa a ser publicada hoje no site ((o)) eco. A reportagem visitou o vilarejo, caminhou entre as casas com telhados cobertos por poeira cinza, ouviu as buzinas e roncos dos caminhões da BR-222, e conversou com moradores, ambientalistas e representantes de movimentos locais sobre impactos ambientais e sociais graves.
O Maranhão integra o rol dos estados da Amazônia Legal, mas em Açailândia – a cidade do açaí – os poucos trechos remanescentes visíveis da floresta tropical estão cobertos pela poeira fina que deixa tudo escuro. Nas décadas de 1960 e 1970, a economia da região foi impulsionada pela extração de madeira, e hoje quase nada sobrou da mata.
Dá para ver a devastação por satélite (afaste o zoom e navegue para visualizar as áreas degradadas):
Desenvolvimento humano
Açailândia fica a 564 km de São Luís, tem 107.790 habitantes e, com sua produção de ferro gusa, é o município com terceiro maior Produto Interno Bruto (PIB) do Maranhão, atrás apenas da capital São Luís e de Imperatriz, a segunda cidade com mais habitantes do estado. Conforme o levantamento mais recente do Instituto Maranhense de Estudos Socioeconômicos e Cartográficos (Imesc), a economia do município gerou cerda de 1,6 bilhão de reais em 2011(8% do PIB de São Luís).
"Na frente de nossas casas passa a estrada de ferro Carajás, ao redor existem indústrias de ferro gusa e, do lado, o entreposto de minério da Vale. É triste morar num local onde todos têm chances de ter problemas respiratórios"
Essa riqueza, porém, não é distribuída, como indicam os números do Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil, que aponta que um em cada dez moradores da cidade (10.12%) é extremamente pobre e um em cada quatro (25,17%) é pobre. No Índice de Desenvolvimento Humano do Município, a cidade tem desempenho de 0,672 . O IDH é uma medida comparativa usada para classificar países e municípios. O índice, que vai de 0 a 1, é composto a partir de dados de expectativa de vida ao nascer, educação e PIB per capita. Tido como um município de desenvolvimento médio, Açailândia se compara ao IDH da Palestina (0,670) e do Paraguai (0,669).
Açailândia guarda histórias como a de Joselma Alves de Oliveira, 37, professora que nasceu e cresceu em Piquiá de Baixo e hoje não tem esperanças em relação ao local. Ainda com os pais vivos e mãe de uma filha adolescente, seu maior sonho é que sua família se mude daqui.
“Na frente de nossas casas passa a estrada de ferro Carajás, ao redor existem indústrias de ferro gusa e, do lado, o entreposto de minério da Vale. É triste morar num local onde praticamente toda a população tem chance de ter doenças de pulmão, garganta e problemas respiratórios”, resume Joselma, a terceira de sete irmãos.
Na rota do minério
Piquiá fica na rota da indústria de ferro gusa nacional, uma das mais lucrativas do país. Todo ominério extraído nas minas de Carajás, explorado pela Vale, em Parauapebas (Pará) passa por Açailândia no caminho pela estrada de ferro até o porto de Itaqui, em São Luís do Maranhão, para suprir a crescente demanda mundial alavancada pelos países emergentes. Com extração de 240 milhões de toneladas de minério ao ano, a Vale é a maior companhia do mundo no setor.
Os números impressionam. Segundo o Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), Parauapebas é o principal município exportador do país, batendo novos recordes a cada trimestre. De janeiro a março deste ano, Parauapebas exportou US$ 2,217 bilhões.
DSCN5286Estrada de Ferro Carajás administrada pela VALE. A ferrovia percorre diariamente 900km entre a mina de Carajás, no Pará, e o porto da Ponta da Madeira, em São Luís do Maranhão. O trem corta 27 municípios, entre eles Açailândia. Foto: Fabíola Ortiz / O Eco.
Toda a produção de Carajás passa por Piquiá. Um trem passa atrás do povoado a cada 20 minutos e buzina, inclusive de madrugada. De todo o minério extraído, 7% é vendido para as indústrias guseiras instaladas no pólo industrial de Açailândia, e o restante, 93%, segue direto para o porto de São Luís. A produção de ferro gusa em Açailândia representa 11% da produção brasileira de gusa.
Além do barulho do trem, os moradores também enfrentam o ruído constante de freadas de caminhões pesados que cortam o povoado através da BR-222 – rodovia que liga Fortaleza (CE) à Marabá (PA), passando pelo Piauí e Maranhão. O barulho é suficiente para tirar o sono de qualquer um e os caminhões, carregados de carvão, cimento, brita e ferro gusa deixam para trás poeira, muita poeira. Das cinco siderúrgicas, ou “firmas”, como são chamadas pelos moradores locais, duas ficam logo atrás da casa de dona Angelita, de 62 anos, mãe de Joselma, a professora que nasceu em Piquiá de Baixo. Foi ela quem acolheu a reportagem por duas noites no povoado.
Dona Angelita
Muitos tentam, mas não é possível levar uma rotina normal. O ritmo de vida segue o compasso das buzinas do trem, dos escapes de chamas e fumaças das guseiras e das freadas dos caminhões carregados.
Localizada na BR-222, a casa de Angelita é a primeira a ser vista pelos que cruzam a rodovia federal. Nos fundos, a família costumava plantar mais de 30 pés de côco, goiaba, laranja, limão siciliano, carambola, manga, acerola, macaxeira e uma boa variedade de hortaliças. A casa de Angelita tem um ar nostálgico da chácara que foi no passado. Há pelo menos 10 anos, o terreno não serve mais para cultivo. Sua plantas estão cobertas por uma camada pegajosa de pó preto.
DSCN4276Dona Angelita mostra a poeira de ferro acumulada nas folhas das árvores no seu quintal. Os fundos da sua casa disputam espaço com as indústrias Viena Siderúrgica S/A e a Gusa Nordeste S/ A. Foto: Fabíola Ortiz / O Eco
"A gente planta, embolam as coisas e (alimentos) morrem com facilidade. As pessoas aqui não aguentam, cada dia é um ruído, uma zoada (barulho) diferente"
“A gente planta, embolam as coisas e (alimentos) morrem com facilidade. As pessoas aqui não aguentam, cada dia é um ruído, uma zoada (barulho) diferente”, conta ao apontar do quintal para as chaminés de duas siderúrgicas visíveis de sua casa.
Não são só as plantas que sofrem. Angelita reclama da falta de ar e de um “aperto no peito” e, há 10 anos, sua filha Joselma sofre com intensa irritação na garganta e inflamação nos ouvidos. Após casar-se, Joselma se mudou com o marido para Piquiá de Cima a 2 km da casa de sua mãe.
Anel de ferro
A pequena Piquiá de Baixo é cercada por um anel de ferro. Atrás da casa de Angelita, ficam as propriedades das indústrias de ferro gusa. O quintal da mãe de Joselma hoje divide a cerca dos fundos com a Viena Siderúrgica S/A e a Gusa Nordeste S/A.
À noite, não há estrelas em Piquiá - o clarão com luzes das indústrias toma conta do céu. A produção do ferro gusa não para. Clareiras, barulho e escapes de fumaça irrompem a madrugada. O verde da vegetação que restou e o rio que leva o mesmo nome da comunidade contrastam com o tom monocromático das casas, com paredes marrom de poeira da estrada e telhados da cor preta e acinzentada do chamado pó de ferro.
DSCN5004Pôr do sol em Piquiá de Baixo. Depósito a céu aberto de material químico para processar o cimento. O terreno fica ao lado das casas de moradores. Animais e crianças perambulam diariamente pelo espaço. Foto: Fabíola Ortiz / O Eco
A vida é inviável em Piquiá. Não é possível respirar ar puro. “Tem dias que está insuportável. Na escola, os alunos e os professores ficam perturbados com o barulho, não dá para se concentrar em nada. Tem hora que dá uns estouros e cobre tudo de poluição. Parece que estão quebrando ferro, dói no ouvido”, diz Angelita que há quase 40 anos vive na comunidade.
Do Piauí, ela se mudou para o vilarejo com o marido João, em 12 de janeiro de 1975, após três anos de casados. O sogro já tinha um terreno na região e convenceu o casal a fazer a vida na cidade. Seu João, hoje com 64 anos e doente após ter sofrido um AVC, foi o primeiro vereador de Açailândia, entre 1982 e 1986, quando o município se emancipou de Imperatriz.
O chamado "progresso"
Como professora do primário, Angelita ensinou na escolinha municipal Almirante Barroso. Lecionou de 1997 até abril deste ano, quando teve que se ausentar para cuidar da casa e do marido enfermo. “Meu marido brigou demais na época contra a ideia de o pólo industrial se instalar no Piquiá”, lembra. A vida era boa em Piquiá, conta a moradora, com água abundante no rio e brejos que cortavam as propriedades.
DSCN4358Dona Angelita mostra o córrego que atravessa parte de seu quintal. A água escorre com uma temperatura mais alta pois é rejeito do que é utilizado para esfriar os altos-fornos das guseiras atrás de sua casa.
Muita coisa mudou na região, relembra a mulher que testemunhou a história da degradação da comunidade. A energia chegou em fevereiro de 1981 e, com ela, o "progresso". A BR-222 foi asfaltada no mesmo ano.
"Eu sabia que viria o progresso, mas não sabia que eram tão irresponsáveis de não ter nenhuma proteção ou de nos orientar. Quando vieram (empresas) para comprar as terras aqui só falavam nos benefícios, que viria trabalho e desenvolvimento"
As empresas se instalaram na região após a construção da estrada de ferro Carajás que, desde 1985, começou a agitar a vida de vilarejos às margens da ferrovia. “Lembro da época que vieram para fazer o desmatamento, em julho de 1975, para a linha de trem (as obras começaram em 1982). Eu sabia que viria o progresso, mas não sabia que eram tão irresponsáveis de não ter nenhuma proteção ou de nos orientar. Quando vieram (empresas) para comprar as terras aqui só falavam nos benefícios, que viria trabalho e desenvolvimento”.
A primeira guseira a se instalar foi a Companhia Siderúrgica Vale do Pindaré, em 1984, do Grupo Queiroz Galvão, que montou na época um alojamento de operários da construção bem ao lado da casa de Angelita.
O pólo industrial de Açailândia contém cinco indústrias de ferro gusa – Viena Siderúrgica S/A, Siderúrgica do Maranhão S/A - SIMASA, Cia. Siderúrgica Vale do Pindaré, Ferro Gusa do Maranhão Ltda. – FERGUMAR, e Gusa Nordeste S/A. Elas processam o minério de ferro bruto e o transformam junto com o carvão vegetal em ferro gusa, uma matéria-prima para a produção do aço. São no total, 14 altos-fornos que precisam da água do rio Piquiá para seu resfriamento.
“As firmas chegavam e compravam as fazendas. Bem no lugar onde hoje é um dos altos-fornos da Viena ficava a casa da minha cunhada”, diz. O quintal de fundos tem 100 metros. Delimitado por uma cerca, o terreno das guseiras fica logo atrás. Ninguém mais pode se utilizar dos riachos que cortam as propriedades dos moradores, estão todos contaminados. Por eles escorre a água quente usada no esfriamento dos altos-fornos. "Não temos coragem de banhar no brejo aqui no meu quintal”, lamenta.
DSCN4283Dona Angelita olha com nostalgia do que sobreviveu de seu quintal invadido pela poeira metálica e pela água que resfria os altos-fornos. Foto: Fabíola Ortiz / O Eco
“A gente não acostuma não, filha...”
De cabelos longos e grisalhos e pele curtida do sol, Angelita está prestes a se aposentar. Altiva e enérgica, é ela quem cuida da casa de quatro cômodos onde sua família vive desde março de 1983. Sua casa abriga cinco pessoas e, até o início do ano, já chegaram a viver onze, entre filhos, genros e netos.
“Tem dias que sinto uma coceira e irritação quando cai o farelinho preto (pó de ferro). Já tem uns 12 anos que sinto isso. A gente não acostuma não, filha... A roupa no varal fica sempre cheia de furinhos de quando caem brasas das chaminés”.
Angelita limpa a casa diariamente e várias vezes por dia. Ela tem cuidado com a limpeza, está sempre com uma vassoura ou um espanador a tira colo. “A gente pensa que a casa está limpa, mas é só botar o pé no chão e passar o dedo nas coisas que fica preto. É só terminar de limpar e na mesma hora já fica sujo. Tem que cobrir tudo, a poeira cai no cabelo, na comida e na roupa”, descreve.
Se tivesse a oportunidade de deixar Piquiá, Angelita não pensaria duas vezes. Ela garante que teria ido embora. “Meu sonho é sair daqui e morar num lugar que a gente tenha uma vida digna. Viver num sufoco desse não representa dignidade para ninguém. Que deus me dê a chance de sair daqui com vida”.
DSCN4322Dona Angelita caminha pelos fundos de sua casa para mostrar os impactos das indústrias de ferro gusa localizadas bem próximo aos moradores de Piquiá de Baixo. Foto: Fabíola Ortiz / O Eco

Esta é a primeira reportagem da série especial Piquiá de Baixo, sobre a vida dos impactados ambientais da produção de ferro gusa no Maranhão

quarta-feira, 9 de julho de 2014

Reforma Política: somar, não dividir!


Por , 09/07/2014 10:31
“Hoje está claro que a reforma do sistema político brasileiro é condição prévia para as reformas estruturais: do Estado, Agrária e Fiscal com auditoria da dívida pública. Não está claro, contudo, como ela deve ser encaminhada. Enquanto a Plenária Nacional dos Movimentos Sociais Brasileiros organiza o plebiscito popular em favor da convocação de uma Constituinte exclusiva, a Coalizão pela Reforma Democrática e Eleições Limpas promove a coleta de assinaturas em favor do projeto de Lei de Iniciativa Popular. Essas duas iniciativas da sociedade civil são de grande valor, desde que uma não anule a outra. O problema é que a diferença entre as duas propostas está se transformando em divergência que as enfraquece. Quero defender aqui a tese de que não há contradição entre elas, pois podem se reforçar mutuamente”, escreve Pedro A. Ribeiro de Oliveira, consultor de ISER/Assessoria. Eis o artigo
IHU On-Line – Pesquisa da Fundação Perseu Abramo mostra que a maioria da população (89%) é favorável à Reforma Política e que 75% a consideram “muito importante”. Mostra também que falta clareza “técnico-política”: as respostas referem-se a combate à corrupção (15%) e privilégios (26%), mais controle social e melhor escolha de representantes (27%); outras referem-se a melhores políticas de saúde, segurança, salarial, educacional, etc . Essa confusão pode ser observada até mesmo entre lideranças de movimentos sociais, que pensam que mais de 1,5 milhão de assinaturas tornam obrigatório o resultado do plebiscito popular. Diante dessa desinformação, é preciso ter claro o que busca cada proposta.
Projeto da Coalizão Democrática
O Projeto de Lei de Iniciativa Popular pela Reforma Política, nasceu do convite da CNBB a entidades da sociedade civil que hoje chegam a quase 100. Para agregar tantas entidades, a proposta teve que limitar-se a pontos consensuais e não proíbe coligações em eleições proporcionais, como é desejo de muitos. Em compensação traz pelo menos uma inovação de grande importância: a regulamentação das doações para campanhas eleitorais. Vejamos rapidamente o conjunto de propostas desse projeto de lei :
a. Proibição do financiamento de campanha por empresa. Instauração do financiamento democrático de campanha, constituído do financiamento público e de contribuição de pessoa física limitada a R$ 700,00.
b. Adoção do sistema de “voto transparente” pela introdução de dois turnos de votação também nas eleições proporcionais (deputados e vereadores): o eleitor vota primeiramente no partido e depois escolhe um dos nomes da lista;
c. Alternância de gênero nas listas de candidatos do item anterior;
d. Regulamentação dos instrumentos da Democracia Participativa, reduzindo-se as exigências para a sua realização e facilitando-se sua tramitação no Congresso;
e. Fortalecimento e democratização dos partidos, para impor programas partidários efetivos e vinculantes;
f. Aumento da participação política de afrodescendentes e indígenas;
g. Criação de instrumentos que assegurem equilíbrio do pleito entre todos os partidos e candidatos.
Merece especial atenção a proposta de regulamentação das doações.
Na atual situação, qualquer empresa pode contribuir financeiramente para custear campanhas eleitorais. Torna-se um bom negócio para a empresa ajudar candidatos que depois de eleitos vão lhe prestar serviços dentro do governo ou defender seus interesses no Parlamento. Basta lembrar a liberação de agrotóxicos, de mineração e de remédios, a especulação urbana, a isenção fiscal ao agronegócio, o favorecimento a empreiteiras de obras públicas e a política de juros altos. Por isso se diz que empresário não faz doações, faz investimentos. Essa promiscuidade entre o interesse público e interesses privados é imoral e tende a descambar para a corrupção.
Além disso, o financiamento das campanhas por empresas eleva muito o seu custo, porque o dinheiro sai do caixa da empresa e não do bolso do empresário. A revista Carta capital de 22/03/2014 traz o exemplo da Oi. Entre seus acionistas está, além de fundos estatais como BNDESPar, Previ e Funcef, a Andrade Gutierrez (representada pela AG Telecom), umas das empreiteiras que mais faz doação de campanha. Para se ter uma ideia dos valores envolvidos, segundo dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) a construtora doou para campanhas do PMDB deEduardo Cunha (que puxou a oposição ao marco civil da internet) um total de R$ 20,6 milhões em 2010 e R$ 14,8 milhões em 2012.
Há então flagrante contradição: pessoas jurídicas, que não têm direito a voto, de fato influem muito mais no resultado das eleições do que quem, ao votar, exerce o direito de cidadania. Essa contradição foi levada ao Supremo Tribunal Federal pela Ordem dos Advogados do Brasil sob a forma de ação direta de inconstitucionalidade. No dia 2 de abril oSTF julgou a ação. Vale a pena transcrever parte do voto do ministro Marco Aurélio:
“Segundo dados oficiais do Tribunal Superior Eleitoral, nas eleições de 2010, um deputado federal gastou, em média, R$ 1,1 milhão, um senador, R$ 4,5 milhões, e um governador, R$ 23,1 milhões. A campanha presidencial custou mais de R$ 336 milhões. Nas eleições municipais de 2012, segundo recente contabilização do Tribunal, teriam sido gastos incríveis 6 bilhões de reais. Apontou-se que os maiores financiadores são empresas que possuem contratos com órgãos públicos. O setor líder é o da construção civil, tendo contribuído com R$ 638,5 milhões, seguido da indústria de transformação, com R$ 329,8 milhões, e do comércio, com R$ 311,7 milhões.”
Embora a votação tenha sido suspensa por interferência do juiz Gilmar Mendes, o resultado já está definido: a maioria do STF (os 6 votos já proferidos) são pela inconstitucionalidade das doações de empresas. A notícia é ótima mas ainda não significa a vitória final da proposta, porque já corre no Congresso um movimento para mudar a Constituição e tornar legal aquela prática. Nesse contexto, o projeto de Lei de Iniciativa Popular torna-se ainda mais importante, porque impedirá essa tentativa de retrocesso legal.
A proposta de plebiscito popular
A proposta da Plenária Nacional dos Movimentos Sociais Brasileiros visa realizar um plebiscito popular sobre a convocação de uma Assembleia Constituinte exclusivamente para fazer a Reforma Política. Embora não tenha valor jurídico, por não ser reconhecido oficialmente, o plebiscito tem força moral quando recolhe um número significativo de votos. Basta lembrar o resultado positivo dos plebiscitos populares sobre a Dívida Externa e sobre a ALCA, que se converteram em força de pressão da sociedade sobre o governo. Também este poderá ser um valioso instrumento em favor da convocação de uma Assembleia Constituinte capaz de fazer a Reforma Política sem submeter-se aos interesses corporativos dos membros do Congresso Nacional .
Além disso, a mobilização para o Plebiscito Popular é uma excelente oportunidade para fazer-se o trabalho de educação política de massa, esclarecendo à população como funciona o Congresso, como se dá o processo eleitoral, para que servem os partidos políticos, e outros temas relevantes. Até a semana do 7 de setembro esse trabalho educativo deve mobilizar os Movimentos Sociais, de modo a obter um bom resultado em termos de votos.
Conclusão
As duas propostas se complementam. A primeira busca efetividade, pois projeto de lei de iniciativa popular respaldado por quase 2 milhões de assinaturas tem muito peso no Congresso. A segunda promove a conscientização política, trazendo para toda a sociedade o debate de questões que a mídia insiste em esconder ou deturpar. Se não há contradição entre elas, a hora é de unir forças e evitar qualquer desqualificação dessas propostas