744
Rosiane Cardoso, membro de uma comunidade pesqueira do Maranhão afetada
pela Vale, denunciou as violações cometidas pela mineradora na reunião do Grupo
de Trabalho sobre o Tratado no âmbito do Conselho de Direitos Humanos das
Nações Unidas. Leia o pronunciamento:
“Bom dia
Falo pela organização Amigos da Terra Internacional e pela Campanha para
desmantelar o poder corporativo.
Sou pescadora, moro numa comunidade tradicional pesqueira diretamente
afetada pela empresa Vale, no povoado Sitio do Meio 2, no município de Santa
Rita, no estado do Maranhão, Brasil.
Vivemos diretamente da pesca, e somos afetados pela empresa desde o
inicio da extração de minério de ferro ha 30 anos.
La nós temos nossos direitos violados.
O direito de ir e vir, porque a ferrovia de Carajás, que leva o minério
do estado do Pará para o porto de Itaqui, na cidade de São Luis do Maranhão,
passa no meio do nosso povoado, nos impedindo, assim, de atravessar a tempo de
levarmos o nosso pescado para vender na cidade.
Direito de produzir nosso alimento, pois, na obra de duplicação da linha
de trem de Carajás, a empresa já aterrou 15 lagos, onde pescávamos.
Lá não somos visibilizados.
A empresa fez o estudo para conseguir a licença ambiental e não incluiu
algumas comunidades em todo o corredor da estrada de ferro Carajás, inclusive
no povoado onde eu resido, impedindo as reparações e a aplicação de medidas de
mitigação dos impactos causados nesses territórios atingidos. Somos
invisibilizados para o IBAMA, para a empresa e pelo próprio governo, é como se
nós não existíssemos.
Para empresa eu não existo para estar cadastrada nos programas de
mitigação, mas sou criminalizada por uma ação judicial da Vale. Nesta ação,
estou impedida de vender meu peixe na cidade pois não posso me aproximar da
ferrovia, como se eu, Rose, pudesse fazer mal a empresa. De fato a empresa
alega que um protesto pacifico das comunidades afetadas durante 3 dias na
ferrovia, teria gerado um prejuízo 600 milhões por dia. Ou seja, a empresa é
quem vai a justiça como se fosse a parte prejudicada pela comunidade.
E qual é o meu prejuízo pela violação do meu direito a alimentação, ao
meu direito de ir e vir, de respirar um ar puro, e direto de exigir os meus
direitos?
Nós não temos meios nem mecanismos para alcançar a justiça e cobrar nossos
direitos. Por isso, temos que procurar outras organizações e movimentos para
denunciar os fatos e para apresentar as nossas propostas aos estados, que devem
ouvir a sua população e nãos as corporações.
O governo brasileiro, assim como outros, não está pra fazer a defesa do
povo, e sim das próprias empresas, já que muitos políticos tem suas campanhas
financiadas pelas empresas.
E o congresso brasileiro quer criminalizar nossas crianças mas não as
transnacionais que violam os direitos humanos tanto no Brasil como em outros
países.
Se eu for removida da minha comunidade, para dar lugar a ampliação da
empresa, e tiver que ir pra uma metrópole, os meus filhos, ao invés de serem o
futuro do Brasil, eles serão os futuros criminalizados pelo Brasil. O que eu sei
fazer dentro da comunidade é pescar, cultivar a terra, como poderia criar meus
filhos numa cidade grande?
Por que os Estados agem para criminalizar os nosso filhos, como esta
acontecendo hoje no Brasil no debate da maioridade penal, e não agem para criminalizar
as corporações transnacionais?
A facilidade que a empresa tem de nos criminalizar não é a mesma que nós
temos para criminalizar a empresa e conseguir acesso a justiça.
Por isso estamos aqui como atingidos pelas empresas transnacionais para
apresentar aos estados propostas para levar as empresas à justiça pelas suas
violações aos nossos direitos.
Então, nós apoiamos a proposta da campanha para desmantelar o poder
corporativo para a criação de um centro publico para o controle das empresas
transnacionais. Esse centro teria a função de analisar, investigar, documentar
e inspecionar as práticas das transnacionais e seus impactos sobre os direitos
humanos, e deve contar com a participação de governos, movimentos sociais,
sindicatos e populações afetadas.
Eu não falo apenas por mim e pela comunidade de onde venho, mas por
todos os povos atingidos pelas empresas transnacionais. Nós queremos ser
consultados, participar da decisão e da fiscalização das empresas. É por isso
que estou essa semana aqui em Genebra: para dizer sim ao desmantelamento das
corporações transnacionais”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário