No universo virtual às vezes nos confundimos com a virtualidade do universo. Obviamente uma coisa não significa a outra, posto que no mundo virtual não estamos necessariamente “desplugados” da realidade; uma realidade que não é universal, mas sim apenas uma particularidade do todo. Já na virtualidade do universo, essa virtualidade existe apenas como possibilidade, uma faculdade realizável. Dessa forma, somos instados a pensar a virtualidade e a realidade sob o prisma dialético e co-existente de duas esferas que se co-constituem, principalmente em termos de compressão tempo-espaço.
A compressão tempo-espaço fez com que exercitássemos a capacidade de reorientar aquilo que entendemos como o tempo - majoritariamente percebido como o cronológico, a mudança - e o espaço, uma categoria extremamente fértil de análises epistemológicas e suscetível de amplas discussões na contemporaneidade. Mas, o que tem ocorrido é um entendimento do espaço como o reino da fixidez, da não dialética, do ser hermético (MASSEY, 2008).
Para então superar uma dicotomia tempo/espaço para uma coação tempo-espaço, no sentido de que ambas as dimensões co-agem uma com a outra (PORTO-GONÇALVES, 2006) é relevante entender que o espaço é inter-relacional, múltiplo e esfera do devir. Tal conceito-chave na Geografia, mas também na Física, tem sido negligenciado no âmbito das ciências humanas e sociais cujas visões tem sido escotomizadas pelo discurso da globalização que luta para diluir as geografias, as marcas que as mais diversas sociedades deixam no espaço (PORTO-GONÇALVES, 2006), para se apropriar do poder no âmbito das próprias relações de poder que definem limites, disputas econômicas e debates epistemológicos, principalmente os que se centram na oposição natureza-cultura.
As relações sociais existentes hoje na contemporaneidade tem nos revelado um dilema que tem imposto barreiras a superação da maior das dicotomias: natureza-cultura. A natureza, no contexto das relações sociais ocidentais/modernas foi entendida e “construída” (ESCOBAR, 2005) ideologicamente como uma entidade, esfera ou ainda, dimensão separada da cultura, e tudo aquilo que é cultivado e desenvolvido pelo homem. Este modo de pensar a natureza (e o espaço, logo, por dedução, a Geografia) é uma herança filosófica oriunda da modernidade, esta última apreendida como um movimento humano paroquial que “dizem ter como berço” a Europa (DUSSEL, 2005). E porque o “núcleo gerador” foi o continente europeu, os outros continentes acabaram por carregar uma imagem primitiva, atrasada e inferior. Se isso aconteceu com todos os povos do mundo não-europeus, num cenário pós-1492, a natureza, na outra ponta, foi raciocinada como o domínio selvagem e a esfera irracional.
Todo este contexto tem buscado congelar a sociedade dentro desse paradigma moderno/ocidental/urbano produtor de dicotomias e impedindo o real exercício da democracia no mundo, logo impedido a universalização da cidadania civil e política como um todo. Os desafios do nosso século dizem respeito a todas estas questões e seus desdobramentos suscitados nessas linhas introdutórias.
REFERÊNCIAS
DUSSEL, Enrique. Europa, modernidade e eurocentrismo. In: LANDER, Edgardo (Org.). A Colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Trad. Júlio César C. B. SILVA. Buenos Aires: CLACSO: 2005. pp.55-70.
ESCOBAR, Arturo. O lugar da natureza e a natureza do lugar: globalização ou pós-desenvolvimento?. In: LANDER, Edgardo (Org.). A Colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Trad. Júlio César C. B. SILVA. Buenos Aires: CLACSO: 2005b. pp.133-168.
MASSEY, Doreen. FILOSOFIA E POLÍTICA DA ESPACIALIDADE: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES. Trad. Rogério HAESBAERT. GEOgraphia - Ano 6. Nº 12. 2004. pp.7-23.
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